The Lobster (Comédia/Drama/ficção-científica); Elenco: Colin Farrell, Rachel Weisz, Lea Seydoux; Direção: Yorgos Lanthimos; Irlanda/Reino Unido/Grécia/França/Holanda, 2015. 118 Min. #FestivalDoRio2015
O privilégio de um festival de filmes não é somente ver filmes inéditos, mas também de ter diante de si uma diversidade de culturas representadas. E mais, perceber o quanto conseguimos acessar tantos assuntos e formas de abordagens e o quanto de conexões conseguimos fazer com o que nos é apresentado. “The Lobster” de Yorgos Lanthimos é esse tipo de filme, que testa as redes do espectador. Produzido por um pool de países tem como diretor e roteirista um grego, logo o método socrático de abordagem não é nenhuma surpresa. O longa versa sobre as imposições silenciosas da sociedade ocidental para que sejamos pares, em detrimento de nossa individualidade. Numa abordagem em que o discurso se contrapõe às circunstâncias e ao óbvio (qualquer semelhança com o nosso cotidiano social não terá sido mera coincidência). “The Lobster” é uma parábola explicativa do adestramento social.
David(Colin Farrel) mora numa cidade em que por lei os solteiros são recolhidos a um hotel e obrigados a acharem um par romântico em 45 dias, Do Contrário serão transformados em um animal de sua preferência. Os solitários são caçados pelos hóspedes do hotel em plena floresta com espingardas. Os dois nichos – os que procuram um par e os que não procuram – têm em comum as regras, todas impossíveis de serem cumpridas. O filme é uma dissertação lenta, e por vezes cansativa, mas nem por isso menos profícua, sobre o amor, sobre o papel dos filhos, sobre até onde o outro é, realmente, necessário,e a partir de que ponto ele se torna um peso. A metaforização da homogeneização dos casais no figurino, a lavagem cerebral sobre a proteção feminina a partir de uma relação, o amor e suas cobranças estapafúrdias, a crítica ao autopoliciamento dos solitários pelo medo de perder a liberdade e o quanto deixam de viver são apenas alguns dos aspectos abordados pela dupla de roteiristas. Enfim, o filme é um celeiro de questões profundas e pertinentes no que concerne as relações humanas no século da solitude.
Yorgos Lanthimos é um diretor grego aclamado em festivais e indicado a um Oscar de filme estrangeiro por “Dente Canino” (2009) e com “The Lobster” já levou o prêmio do Juri do Festival de Cannes e foi indicado à Palma de Ouro. É o primeiro filme do cineasta na língua inglesa e grande parte dele foi filmado com luz natural e muito pouca maquiagem ou nenhuma – uma metáfora gloriosa da ‘verdade’ ou da busca dela . A narrativa é feita pela mulher que enxerga mal (Rachel Weisz). Yorgos e Efthymis Filippou quando fizeram o roteiro foram cirúrgicos em relação a identidade. O único personagem que tem nome é David o restante são chamados e referenciados pelas atividades que exercem ou por adjetivos: a empregada, a gerente do hotel, o homem que manca, a mulher sem coração, o homem balbuciante, etc…O forte do filme são os diálogos, são eles que sinalizam a abordagem sociológica , o adestramento e o enquadramento. Lanthimos pinta um painel sobre a solidão, a necessidade de controle e o que é liberdade. Mas também versa sobre o encantamento, a atração e seu processo, a instituição dos códigos entre os amantes e seus efeitos: a cegueira, a automutilação o anular-se. Além de deixar as portas abertas para a reflexão sobre o verdadeiro valor da liberdade: ver as coisas como elas são, ou o mais próximo disso – poder continuar enxergando e questionando e ao invés de uma homegeneização, propõe discretamente, uma sincronia.
“The Lobster” é um tesouro metafórico de questionamentos das instituições sociais e conceituações de estado de coisas criados por nós, em detrimento de nós mesmos, contra nossa natureza e que deixa o doce veneno de onde deve estar o limite ….na mutilação do próprio indivíduo e da sua singularidade. Bárbaro!
- Festival do Rio 2015 – Mostra Panorama do Cinema Mundial
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