X-Men: Apocalipse

X-Men: Apocalipse

Por | 2016-05-28T02:12:20-03:00 28 de maio de 2016|Análise cinematográfica|0 Comentários

X-men: Apocalipse (X-men: Apocalypse) (Ação/Aventura/fantasia); Elenco: James McAvoy, Michael Fassbender, Jennifer Lawrence, Oscar Isaac; Direção: Bryan Singer;  USA, 2016. 144 Min.

“Nada é sem significado”

(Wolverine Imortal/2013)

É público e notório que as sagas de super-heróis são bem mais do que mero entretenimento. Que nas entrelinhas temos abordados aspectos políticos, econômicos e ideológicos. E, talvez, a franquia X-men seja a mais interessante delas pelo viés que aborda: a diversidade, o multiculturalismo, o preconceito de raça, de orientação sexual, o antissemitismo e a religiosidade, como searas, nichos e aspectos a serem postos sob holofotes para serem pensados. Os X-men são o núcleo mais multicultural da Marvel, e portanto, merecem uma análise mais cuidadosa e um olhar mais demorado.

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Passados uma semana do lançamento de “X-men: Apocalipse” no circuito, já dá para fazer uma análise cinematográfica com propriedade. Já que, para tal,  há a necessidade de citação de cenas e de exemplos que fundamentem as hipóteses levantadas. Como todos os nerds e cinéfilos alucinados já devem ter assistido, a culpa se torna menor em relação aos danos ao prazer da cinefilia.

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“A Maioria das pessoas desse mundo jamais verão além do que os seus olhos podem ver” (X-men 2/2003)

A primeira aparição dos X-men foi nas HQs em 1963, em plena era da Guerra do Vietnã, da luta pelos direitos da minorias: os movimentos negro e homoafetivo. Os mutantes eram definidos como portadores de habilidades especiais devido às mutações genéticas no processo de salto evolutivo da espécie. Cientificamente, nas HQs, eram chamados de “homo superior”. O contexto era o medo e a desconfiança dos homens comuns em relação ao desconhecido,  e a consideração de que eram uma ameaça à sociedade humana como se instituía. A luta era pela convivência pacífica mediante aceitação dos humanos e contra a irmandade mutante, liderada por Magneto, que pregava a guerra entre os diferentes.

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O Núcleo mais multicultural da Marvel tem diversas etnias e outras nacionalidades além da americana. O Noturno (Kurt) é alemão, Banshee (Sean) é irlandês, Wolverine (Logan) é Canadense, Magneto (Erick) é europeu de origem judia, Colossus (Piotr) é soviético – lembrando que na época a URSS ainda existia -, Tempestade (Ororo) é queniana e Solaris (Shero) é japonês, dentre outros. Os temas que atravessam as histórias são relativos às minorias étnicas e outros grupos de oprimidos, com questões sociopolíticas, como o racismo, a homoafetividade, o antissemistismo e a diversidade religiosa. O professor Xavier foi comparado por críticos de quadrinhos a Martin Luther King devido a sua postura pacífica e a referencia dos mutantes ao seu sonho de convivência inter-racial. Já Magneto à Malcom X por sua contundência e agressividade, ou com um revolucionário radical liderando um grupo semelhante aos Panteras Negras. Os sentinelas seriam a metáfora de forças opressivas como a KKK que negavam direitos políticos e civis aos mutantes. Em relação a orientação sexual: Estrela Polar (Jean-Paul) é gay, Mística( Raven) é bissexual, Hulkling (Teddy) e Wiccano (Billy) têm um relacionamento e Anole (Victor) é assumido. O antissemitismo também está presente, na personagem de Magneto que é um sobrevivente do Holocausto e na situação dos mutantes diante do mundo, a de perseguidos. Faz ainda alusão ao medo comunista, ao movimento que torna tudo comum a todos, lembrando o McCarthismo pela forma como o congresso conduz as investigações sobre os mutantes; e a estratificação cultural, quando são uma alegoria de uma minoria que estabelece uma ‘subcultura’ paralela. Quanto a diversidade religiosa, Noturno é Católico fervoroso, Karima Shapandar é Hinduísta e por aí vai. A versão em Quadrinhos é um painel muito bem desenhado da abrangência do termo mutante em relação aos aspectos culturais, sociológicos, políticos e afins. A versão cinematográfica é mais branda, mas nem por isso deixa de se conectar com essas abordagens, principalmente nos diálogos, de forma bem sutil.

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“Dizem que você imita qualquer um,fica igual a todo mundo. Então porque não fica disfarçada o tempo todo (… ) -Porque não se deve fazer isso” (X-men 2)

No cinema os X-men deram o ar da graça em 2000 com “X-Men: O Filme” e a partir daí as histórias de se desenvolveram enfatizando a questão do preconceito de forma geral, e focando em um ou outro personagem como âncora. “X-Men: Apocalipse” é baseado no arco das HQs da Era do Apocalipse. Mas na filmografia, em relação à cronologia da história, se situa entre “X-Men: Primeira Classe” (2011)  e “X-Men: O Filme” (2000). A saga cinematográfica é um vai e vem no tempo cronológico, que sequenciado ficaria: “X-men Origens: Wolverine” (2009) de Gavin Hood, que se inicia em 1845; em seguida “Wolverine Imortal” ((2013) de James Mangold que tem seu contexto histórico no japão, se inicia na Segunda Guerra Mundial na cidade de Nagasaki e inaugura a possibilidade de transferência de poderes, que será viabilizada como argumento em “X-Men: Apocalipse”. A continuação e formação do grupo se dá em  “X-Men: Primeira Classe” (2011) de Matthew Vaughn, que versa sobre o que é normalidade, trabalha a autoaceitação, o autocontrole, a adaptação e conta a história de Magneto e Xavier. E sua mensagem maior é a do equilíbrio entre a raiva e a serenidade. Aí entra “X-Men:Apocalipse” com a apresentação do primeiro mutante do mundo, no Egito Antigo, com sua estratégia de acúmulo de poder e vida eterna, uma espécie de Alfa e Ômega. Depois, na continuação sequencial da história é que vem “X-men: O Filme“(2000) e “X-Men 2” (2003) ambos de Bryan Singer, na sequência “X-men: O Confronto Final” (2005) de Brett Ratner e “X-Men: Dias de Um Futuro Esquecido” (2013), também de Bryan. Dos oito filmes da franquia, quatro foram dirigidos por Bryan Singer. Logo, não ficou difícil fazer os links que se encaixam muito bem na história, inclusive com os filmes dirigidos pelos outros cineastas.

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Em “X-Men: Apocalipse” somos apresentados ao primeiro mutante do planeta: En Sabah Nur (Oscar Isaac), um egípcio que, nas proximidades de 3000 antes da era comum – o longa não usa as terminologias A.C/D.C, até porque pela lógica da história Cristo também seria um mutante – e à história pessoal de Magneto (Michael Fassbender). Aqui temos a humanização de Magneto, com a formação de uma família, a obtenção de um trabalho e uma tentativa frustrada de inserção na vida social do homem comum. Aqui somos solidários a Magneto como nunca, e ousamos compreende-lo sem culpa. Se em “X-Men: O Confronto Final” odiamos Magneto pelo tratamento dado a Mística (Jennifer Lawrence), em “X-Men: Apocalipse” ensaiamos a compaixão, na mesma proporção e, quiçá, empatia para com ele. Compreendemos sua dificuldade em confiar, sua tendencia a traição, seu ódio e suas ações contundentes. Nesse episódio, dentro da saga cinematográfica que nos foi apresentada ao longo desses 16 anos, já sabemos o final de cada um. Então se entregar a observação dos links que conectam a saga é quase que natural para quem é fã. No filme Apocalipse/En Sabah Nur depois de ressuscitar recruta seu grupo de mutantes: os quatro cavaleiros do apocalipse com objetivo de destruir o mundo sem deixar pedra sobre pedra. Com algumas remetências bíblicas a história cai no lugar comum de ter o professor Xavier e seu grupo de mutantes tentando impedi-lo. Mas tem aperitivos interessantes, como o início da descoberta dos poderes de Ciclope/Scott (Tye Sheridan), a iniciação de Tempestade (Alexandra Shipp) e um relance da condição de animal de Wolverine (Hugh Jackman). Além da entrada triunfal de Mercúrio (Evan Peters) ao som de “Sweet Dreams (are made of This)” de Eurythmics. Um Show! E das remetências paródicas ao “Superman”; “O Homem de Aço” (General Zod) e a Star Wars.

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“Os caras bons são os caras maus” (x-men 2)

Bryan Singer, que tem no currículo o genial “Os Suspeitos” (1995) tem em “X-men: Apocalipse” sua visão do início dos X-men como formação oficial de um grupo de Super-heróis. Na realidade ele faz uma releitura do que Matthew Vaughn fez em “X-Men: Primeira Classe” com mais corpo e glamour histórico e fecha redondinho. Até aqui a gente pode dizer que Bryan é o pai da versão cinematográfica dos X-men. Para não deixar de falar de tecnicalidades, dentre os aspectos que metaforizam a diversidade da saga estão a poliglotia, são falados inglês, alemão, árabe, polonês e egípcio antigo. A trilha sonora assinada por John Ottman de “Quarteto Fantástico” (2005/2007) vai de Metallica a Eurythmics, passando por uma composição clássica retumbante. O roteiro foi escrito por Simon Kimberg de “Perdido em Marte” (2015) e conta com um ator principal, Oscar Isaac, que é guatemalteco filho de cubano e neto de francês, mais X-men impossível.

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Para fechar “X-Men” é uma franquia de sucesso que está presente em vária mídias, dos HQs aos Animes, passando por Desenhos animados e jogos eletrônicos e que há dezesseis anos vem dando uma utilidade nobre ao CGI no cinema. Em “X-Men: Apocalipse” já conhecemos toda a história da versão cinematográfica, sabemos como termina Jean Grey (garota Marvel) a supermutante nível 5 (X-men: O Confronto Final), qual é o fim de Wolverine (X-men: Dias de um Futuro Esquecido) e apenas nos concentramos num recorte de tempo sobre a saga. Já sabemos que o mundo não se concerta, que se administra conduzindo para o melhor final possível, o da igualdade. E que nesse ínterim, entre o Alfa e o Ômega, ainda tem muita água para rolar embaixo dessa ponte, pelo menos na versão cinematográfica.

“A natureza ri por último” (X-men 2)

Sobre o Autor:

Editora do site Cinema & Movimento e crítica cinematográfica

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