O Quarto de Jack (Room). (Drama); Elenco: Brie Larson, Jacob Tremblay, Sean Bridges; Direção: Lenny Abrahamson; Irlanda/Canadá,2015. 118 Min.
Baseado no livro “Quarto” de Emma Donogue, o longa-metragem “O Quarto de Jack” conta a história de uma menina sequestrada aos 19 anos e mantida em cárcere por mais de 5 anos, período em que deu à luz ao filho de seu algoz. E a relação que ela desenvolveu com seu filho, e a dele com o mundo. Com o roteiro assinado pela própria autora do livro, o longa é coroado com atuações espetaculares.
Joy/Ma (Brie Larson) foi sequestrada pelo Velho Nick (Sean Bridges) e vivia num cômodo exíguo com Jack (Jacob Tremblay), filho do sequestrador. O mantinha escondido do pai dentro de um armário durante suas visitas, não permitindo criação de afeto. A maestria do longa está na malemolência da mãe em contornar as situações de irritação, perguntas, curiosidades de seu filho; na produção de um ambiente de carinho e de afeto mesmo vivendo um terror absurdo; e na criação de vínculos de confiança com seu filho. A cereja do bolo é a narrativa, que é feita pelo próprio menino. Sua visão de criança, sua construções poéticas com conotações infantis e doces.
A história foi inspirada no caso Josef Fritzl, o monstro de Amstetten, que sequestrou a própria filha e a manteve em cárcere durante 24 anos tendo sete filhos com ela. E contou com pesquisas sobre sequestros e casos de crianças que cresceram longe do contato com a sociedade e ainda, complementações de leituras sobre diferentes configurações familiares, sobre relações de mães com seus filhos em prisões escandinavas (Emma Donogue é irlandesa), sobre crianças refugiadas e filhos autistas. Além da experiencia de ser mãe. Tudo isso possibilitou a Emma ( que também roteirizou o filme) a compor essa criação belíssima que é a visão de Jack do mundo.
O filme tem ainda como destaques as atuações de Brie Larson de “Temporário 12” (2013), que está soberba e já arrebatou todos os prêmios importantes na categoria de melhor atriz desta temporada, dentre eles o Globo de Ouro e o BAFTA. Mas a grande surpresa é Jacob Tremblay que deu um show e nos faz lembrar dos prodígios mirins do cinema, Christian Bale e Leonardo DiCaprio pela sua total entrega e inserção emocional nos personagens, sua concentração e desenvoltura. Experiencia não lhe falta. Do alto de seus 10 aninhos já tem currículo filmes de TV, curta-metragens e “Smurf 2” (2013).
Quanto ao diretor Lenny Abrahamson de “Frank” (2014), sua meticulosidade na orientação das atuações de emoções, sua abordagem imagética nas visitas do algoz e nas insinuações de curiosidade de ambos os lados (do sequestrador e do menino); na alienação do garoto por parte da mãe em relação ao pai/algoz são sutis e brilhantes. Por tudo isso “O Quarto de Jack” já ganhou o Globo de ouro de melhor atriz e foi indicado ao prêmio maior do cinema em quatro categorias: melhor filme, atriz, diretor e roteiro adaptado.
Em suma, o cinema e sua possibilidades de contar histórias de forma multifacetada só se aperfeiçoa, só evolui. Em “O Quarto de Jack” o espectador assiste a várias violações de direitos humanos e ao mesmo tempo viaja emocionado naquela narrativa pura e singela de Jack. Descortinando para nós um mundo que, sabendo da história, não enxergamos. Então, o longa de Lenny Abrahamson consegue nos dizer que o mundo não é um só, são vários. Só depende dos olhos de quem vê. E isso nos remete a “Martian Child” de Menno Meyjes em que uma criança abandonada inventa um mundo extarordinário a partir de suas necessidades afetivas. A diferença é que neste o ângulo de visão é o do adulto e o da obrigatoriedade da sociabilidade e inserção social. E em “Room” (no original) isso é uma consequência, o que importa é o olhar do menino e os efeitos que ele causa em nós. Simplesmente extraordinário!
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