Tristeza e Alegria

Tristeza e Alegria

Por | 2015-09-30T06:53:56-03:00 30 de setembro de 2015|Crítica Cinematográfica|0 Comentários

Tristeza e Alegria. (Sorg og Glaede/Sorrow and Joy). (Drama); Elenco: Jakob Cedergren, Helle Fagralid, Ida Dwiger, Kristian Halken, Nicolas Bro, Soren Pilmark; Direção: Nils Malmros; Dinamarca, 2013. 107 Min.

Estamos acostumados a ir ao cinema para nos divertirmos. No máximo, para fazer uma reflexão, ou conhecer alguma história interessante – leia-se, bonita. Nunca para nos incomodarmos, pois de incômoda já basta a vida, diriam alguns mais prosaicos. É….mas Nils    Malmros não pensa assim e sempre fez de seu cinema uma espécie de catarse com camadas autobiográficas. Pois bem, “Tristeza e Alegria” versa sobre o aprendizado do amor, mas de uma forma dissonante daquela a que estamos acostumados. A narrativa é uma tragédia grega real numa metáfora de bipolaridade poética.

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Signe (Helle Fragralid) é uma professora de crianças e sofre de depressão. É diagnosticada maníaco-depressivo severa. Tem histórico de suicídio na família, é altamente sugestionável e insegura. Johannes (Jakob Cedergren) é um cineasta que se encanta por Signe, se apaixonam e iniciam um romance. São duas pessoas muito diferentes na forma de receber o que ouvem. Mas, se entendem e são felizes.    Por conta disso, Signe suspende os remédios e constituem uma família. Até que um dia Signe, num surto psicótico mata a filha Maria (Mads Honore/ Polly Estund Grinaker). E ao contrário do que qualquer pessoa faria – considerar Signe um monstro – Johannes vai atrás dos porquês, do que foi que não enxergaram, dos sinais deixados ao longo da jornada. Conversa com o psiquiatra forense, com  a família, com o diretor da escola. E recebe todos os sinais positivos de que Signe era uma pessoa doce. Os pais das crianças na escola a querem de volta, após cumprida sua pena. E isso colabora no julgamento de Signe. “Tristeza e Alegria” não é um filme forense, não é um filme açucarado sobre o perdão, nem uma ode a hipocrisia. É um filme sobre o ser humano e sua fisiologia, as possibilidades absurdas que cercam a vida de todos nós, mas que a gente só acha que acontece com o vizinho.

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O cinema nórdico tem um histórico de falar sobre coisas que não queremos ouvir, que o diga “Força Maior” (2014) de Ruben Östlund e maioria dos filmes de Lars Von Trier: “Dogville” (2003), “Manderlay” (2005), para citar alguns. Independente da mestria ou não, com a qual são abordados, estão lá.  Nils Malmros mostra, através dessa história dura, o quanto somos complexos. E nesse ínterim faz analogias do surto psicótico com pequenos estados de ausência que todos nós temos: um susto durante o sono,etc… e  questiona se alguém pode ser responsabilizado por algo num estado desses. Nils é didático, mas em nenhum momento defende a história ou fala de perdão. O filme também não é uma saga de tribunais. Ele avalia onde está a culpa, e faz um dossiê de negligências das pessoas que estavam ao redor e que não perceberam sinais gritantes. A viagem de Nils Malmros é para dentro, para a nossa fisiologia emocional e faz isso mexendo na dor e causando outras dores intensas em todos nós. O filme é extremamente doloroso, mas Nils o conduz com serenidade, equilíbrio e leveza, isso mesmo, ficamos atentos até o final para sabermos o que o cineasta quer, qual será o seu desfecho, qual a sua linha de raciocínio, seu objetivo. E ela não podia ser melhor.

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O filme ganhou o prêmio de melhor atriz para Helle Fagralid no Robert Festival 2014 e teve outras 15 indicações, dentre elas: o Marco Aurélio de Ouro do festival de Roma para Nils Malmros. A fotografia é de Jan Weincke de “Marionetes” (2004) e conta com o premiado ator sueco Jakob Cedergen de “Submarino” (2010).

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Essa história seria só mais uma no imaginário cinematográfico se não fosse uma história real. A história do próprio Nils, que termina o filme que conta uma história sobre o aprendizado do amor, dedicando à própria esposa, a prof.ª Marianne Fronhalt (Anne), com quem é casado há 33 anos, e que foi a grande incentivadora de que essa história fosse contada ao mundo todo. Enquanto a NASA gasta milhões para descobrir vida a mil anos-luz de nós, o cinema tem investido na viagem oposta, para dentro de nós. “Tristeza e Alegria” é uma pérola negra dentro de uma ostra no meio do oceano. Dolorosamente espetacular.

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Sobre o Autor:

Editora do site Cinema & Movimento e crítica cinematográfica

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