“Descobri que a melhor maneira de lidar com artistas era entregando-lhes medalhas (…) se eu lhes desse taças e prêmios eles se matariam para produzir o que eu quisesse. Então, criei o Oscar (Louis B. Mayer – fundador da Academia de Artes Cinematográficas e da Metro-Goldwyn-Mayer/MGM)
Hoje é dia da maior festa no mundo do cinema. Honraria concedida por competência artística e fomento a comercialidade dos filmes na indústria cinematográfica, a estatueta concebida pelo diretor de arte Cedric Gibbons e o escultor George Stanley – o Oscar – é o maior prêmio do cinema mundial. Entregue anualmente e denominado oficialmente como Academy Awards é símbolo de prestígio profissional. Teve sua primeira edição em 1929 num jantar privado para 270 num hotel em Los Angeles. Teve sua primeira transmissão para TV em 1953 e hoje é um dos maiores eventos midiáticos se comparando à copa da FIFA e às olimpíadas em termos de audiência em todo o planeta. A categoria de filme estrangeiro foi inserida em 1957, até então era um prêmio especial ou honorário. Em 2002 a categoria de filme animação foi adicionada ao quadro da premiação e essas modificações são só uma analogia do movimento pelo qual vem passando o Oscar. De fomento ao Star System o palco político a cerimônia tem sofrido modificações técnicas e comerciais.
Desde 2003 quando Michael Moore ao receber seu Oscar por “Bowling Columbine” fez um discurso inflamado contra o governo de então sob os olhares estupefatos dos colegas da plateia, que o elástico vem distendendo de vez e as edições tem tido discursos mais apimentados daqui, mais temperados de lá, com alfinetadas políticas e reivindicatórias, com questionamentos relativos à pouca representatividade afrodescendente, às diferenças salariais entre gênero, às necessidades de espaço para as causas da diversidade humana em todos os sentidos. A quase porta-voz dos discursos politizados é Meryl Streep, pipocando insatisfações daqui e dali. Todo esses movimento lento e silencioso fez mudar o perfil dos filmes que concorrem ao prêmio principal e a filme estrangeiro.
De uns tempos para cá a premiação tem sido mais diversa, mesmo que ainda tímida. Em 2010, tivemos um filme dirigido por uma mulher ganhar o prêmio principal, era “Guerra ao Terror” de Kathryn Bigelow; em 2013, “12 Anos de Escravidão” de Steve McQueen, mesmo diante de muitas incoerências como a injustiça de “Creed: Nascido para Lutar” ser estrelado por Michael B. Jordan e o indicado ter sido Silvester Stalone, ou ainda em “Selma: Uma Luta pela Igualdade” que tinha potencial para ser indicado nas categorias de filme, diretor, ator principal e canção e só foi indicado a canção, prêmio esse que abocanhou, dentre mortos e feridos as diferenças são vistas aos poucos, devagar e a olhos nus. Hoje o Oscar não é só uma festa de glamour e ovações. Pela audiência monumental, é também palco de questionamentos, protestos tímidos, manifestações comportadas e movimentos silenciosos.
Hoje, o perfil dos filmes indicados da cerimônia monta o painel que da uma cara mais diversa à premiação, e se olharmos os filmes da categoria principal e a de filmes estrangeiro temos indícios de uma mudança lenta de quebra de conservadorismo. A produção independente “Me Chame pelo Seu Nome” é um bom indicador que teve suas portas abertas depois de “Moonlight”. O filme de terror “Corra!” que desde o gênero no qual ele está enquadrado até o assunto e a abordagem nos mostram que já há um espaço para questionamentos e afins. Mas também não deixa de ter os lobistas como “A Forma da Àgua”; a produção artística primorosa que é “Dunkirk”; o fraquinho “Lady Bird” que poderia tranquilamente dar lugar a “Detroit em Rebelião” e “O Estranho que Nós Amamos” que são produções competentíssimas em todos os sentidos e foram dirigidos por mulheres, o primeiro por Kathryn Bigelow e o outro por Sofia Coppola; tem ainda espaço para o ufanismo e para um afago na imprensa, com “O Destino de Uma Nação”, cujo grande mérito é Gary Oldman e “The Post: A Guerra Secreta”. Os geniais, por aspectos diferentes, “Trama Fantasma” e “Três Anúncios Para Um Crime”. Quanto aos filmes estrangeiros a coisa fica ainda melhor com abordagens inteligentes e, por vezes, incômodas. “Corpo e Alma” versa sobre as necessidades de nossa essência de forma visceral; “Sem Amor” faz o mesmo mostrando o lado sórdido do humano; o chileno “Uma Mulher Fantástica” conta a história de uma transexual e entra na linha de quebra do paradigma do conservadorismo; “O Insulto” é sem igual e versa sobre a possibilidade de paz no mundo numa abordagem cotidiana intensa; e o favorito “The Square” que versa sobre o mal do mundo: a falta de ética e de solidariedade. Ou seja, pelos assuntos trazidos para esta edição se percebe a abertura para diversidade de gênero, de orientação sexual, de questionamento sobre preconceito racial e outros temas polêmicos no mundo como guerras e guerrilhas.
O Oscar já promotor do Star System, de impor ao mundo seu mundo plastificado. Hoje tem se mostrado mais afeito à realidade, mais aberto a alguma mudança, mesmo que seja lenta. Foi-se a época em que para participar do Oscar tinha que ser filme de romance super tradicional ou super produções como “Spartacus”. Hoje temos filmes com méritos artísticos nos quesito imagético, de argumentação, aqueles que são a argamassa do contexto das indicações e que têm cara de Oscar, os fracos que parecem ter caído do céu por conta de misericórdia e os besteróis. Mas, tem uma gama de filmes com conteúdo e qualidade técnica que dá gosto. E isso é bom de ver. Para fechar, até a festa que é a cara da hegemonia americana está mudando e, esperamos, evoluindo. Se rendendo à realidade com suas diversas cores, contextos e complexidades. Que continue melhorando. A vida é feita de ensaios e erros e caminhando assim, um dia se acerta. E que nos poupem das gafes, que delas estamos fartos. Agora é preparar a pipoca e …And the Oscar goes to….
Confira ainda a lista completa dos indicados (Aqui!)
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