Boyhood – da infância à juventude. (Boyhood). (Drama); Elenco: Ellar Coltrane, Patricia Arquette, Ethan Hawke; Diretor: Richard Linklater. USA, 2014. 165 Min.
Dizer o que é ou não uma obra-prima é uma tarefa difícil e ousada. Mas possivelmente estejamos diante de uma. Trata-se da história de vida de Mason (Ellar Coltrane) dos seis aos dezoito anos de idade. Com todos os momento significativos, ou a síntese desses momentos, representados pelos que foram selecionados pelo diretor. Não, não é um documentário. É uma ficção. Uma viagem sobre a jornada da paternidade. É uma espécie de cápsula do tempo com reflexões existenciais pertinentes, diálogos altamente significativos e que se conectam brilhantemente. Em nenhum momento há diálogos ou imagens que sejam insignificantes, ou que não se sinta a ligação que eles têm, com todo o conjunto da jornada proposta por Linklater, que além de dirigir também roteirizou e produziu o filme.
O que faz dessa obra algo primoroso é a sua construção. A forma com a qual ela foi concebida. Doze anos de filmagens. Mais de uma década na vida de todos os envolvidos. Um projeto que foi criado para ser assim. Quando Linklater convidou Patricia Arquette ( Mãe/Olívia) perguntou-lhe o que ela faria nos próximos doze anos de sua vida. E a Ethan Hawke (pai/Mason ) pediu que terminasse o filme caso ele (Linklater) viesse a falecer. O projeto foi sério e o cosmos conflagrou a favor. Diante das câmeras o menino Mason cresce e se desenvolve física/cognitiva/emocionalmente. Os atores envelhecem, os corpos mudam, as rugas aparecem e a história fica cada vez mais interessante e parecida com a de todo mundo. O enredo é o dia-a-dia comum, a escola, os casamentos da mãe, a personalidade descolada do pai, a luta pela sobrevivência, os conflitos internos, a síndrome do abandono do ninho, o envelhecimento, a sensação de ter perdido tempo, de não ter feito os suficiente…tudo isso contextualizado com a idade dos personagens e o tempo histórico (2002 a 2013). “Um estudo honesto sobre o cotidiano de uma família comum de pais separados”, foi a definição dada pelo próprio Linklater . Trinta e nove dias de filmagem em uma produção de quatro mil e duzentos dias, todo filmado na terra natal de diretor, o Texas.
Linklater vem de obras como “Antes do amanhecer” (1995), “Antes do pôr-do-sol”(2004) e “Antes da Meia-noite” (2013). Ellar Coltrane é conhecido por “Nação fast food: uma rede de corrupção” (2006), Patricia Arquette por “Médiun” (série de TV) e Ethan Hawke por “Dia de treinamento” (2001) e juntos durante doze anos abriram um precedente e tanto para o cinema de ficção, pois essa saga é comum em documentários, mas na ficção possivelmente, foi “navegar por mares nunca d’antes navegados”. O que também se aplica à trilha sonora. Composta por sessenta músicas, aproximadamente. E o ecletismo é de arrepiar e acompanha as músicas da época das gravações. Tem Coldplay, George Harrison, Daft Punk, Foo Fighters, Lady gaga, Bob Dylan, Paul Mccartney & Linda e Ethan Hawke, isso mesmo com La Freeway de Guy Clark interpretado por Ethan e composições do próprio, como: Ryan’s Song e Split the difference. Uma fotografia belíssima de Shane F. Kelly o mesmo de o “O homem duplo” (2006) uma mistura de filme com desenho animado que levou cinco prêmios em festivais.
E por falar em prêmios, “Boyhood- da infância à juventude” por onde passa é aclamado por público e crítica (Rotten Tomatoes, IMDB e Metacritic). Estreou em janeiro no Sundance Film Festival e já levou dez premiações. No Festival de Berlim levou melhor diretor, prêmio do júri, o Prize of the Guild of German Art House Cinema, além da indicação ao Urso de Ouro. No SXSW Film Festival levou o Louis Black lone star awards e o reconhecimento especial do júri. No San Francisco International Film Festival melhor filme; no Festival de Seattle melhor diretor; e no San Sebastian o FIPRESCI. E recentemente, foi indicado em quatro categorias no Gothan Independent Film Awards, melhor filme, melhor ator principal (Ethan), melhor atriz (Arquette) e melhor ator revelação para Ellar Coltrane.
Nunca a vida de todos nós, com todos os equívocos, as dores, os abandonos, as crises, os recomeços, os vexames, as alegrias e o movimento do cotidiano foram tão bem retratados e tão ovacionados. Ao filme “Boyhood – da infância à juventude” e a Richard Linklater nossas reverências, pois tudo indica que sim, estamos diante de uma obra-prima.
Deixar Um Comentário