Como Você É

Como Você É

Por | 2018-06-17T00:41:57-03:00 10 de dezembro de 2016|Crítica Cinematográfica|0 Comentários

Como Você É (As You Are) (Drama/Mistério); Elenco: Owen Campbel, Charlie Heaton, Amanda Stenberg, Scott Cohen, Mary Stuart Materson; Direção: Miles Joris-Peyrafitte; USA, 2016. 110 Min.

“Como Você É” é o primeiro longa-metragem de Miles Joris-Peyrafitte como diretor, e sem se intimidar Miles também roteirizou e deu uma mãozinha na trilha sonora. Mas, o forte é o roteiro. Numa estrutura narrativa de “Rashomon” (1950) misturada a descoberta da sexualidade no contexto da década de 90 e numa sociedade normativa, Miles decidiu dar ênfase a dificuldade de autoaceitação por parte de um jovem que se descobre com orientação sexual homoafetiva. Numa história entrecortada em que são apresentadas várias versões para um acontecimento, o filme versa sobre o quanto uma educação rígida e  uma sociedade hipócrita podem trazer de sofrimento para um indivíduo. O longa fala sobre as consequências de uma educação e de uma sociedade homofóbica. Peyrafitte aborda a questão da autoaceitação, da administração do desejo e  fala sobre a constituição de alma de cada um de uma forma sensível e sutil em alguns momentos e contundente em outros. E essa bipolaridade é proposital e encontra eco na história.

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Jack (Owen Campbel) é menino que não se sente atraído por meninas, gosta de seus amigos,  nunca teve uma relação sexual e é tímido. Criado por Karen (Mary Stuart Materson), uma mãe sozinha, sensível e dedicada. Um dia Karen conhece Tom (Scott Cohen), pai de Mark (Charlie Heaton), um homem severo e disciplinador. Vão todos morar juntos formando, então, uma família. Mark e Jack Estudam na mesma escola e conhecem Sarah (Amanda Stenberg). Todos adolescentes, todos no Ensino Médio, todos vivendo a fase de descoberta do sexo, da vida e de si mesmos. E assim, a história começa com complexas ligações e camadas múltiplas. Miles e Madison Harrison  abordam a heterossexualidade, a homoafetividade, a cultura da violência numa sociedade armada até os dentes e a relação entre pais e filhos. E faz tudo isso a partir de pontos de vista de lembranças de um acontecimento através de depoimentos policiais. A história se apresenta vista de vários lugares, mas sua maestria é deixar o lugar do espectador reservado. Muito parecida com “O Cheiro da Gente” (2014) quanto ao nicho de atuação  – a sexualidade adolescente – “Como Você É” só não se aventura pelo submundo. Mas traz todos os questionamentos sobre sexualidade e seu exercício, incluindo o choque de gerações.

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O longa-metragem se propõe a uma reflexão sobre a educação e a nocividade da normatividade; sobre os valores imiscuídos às relações do cotidiano e as expectativas alheias; sobre a coragem que alguém tem que ter para ‘peitar’ o mundo e a si mesmo quando se descobre ‘infringindo’ uma norma silenciosa. A saga do sofrimento de Mark é uma lamparina para chamar atenção para o poder dos instintos. E a maneira com a qual Miles Joris-Peyrafitte fez a abordagem é toda especial. É um filme que, no que diz respeito a cenas sexualizadas, é leve. Mas nos quesitos violência de uma sociedade e familiar é muito forte e angustiante. Miles marca o tempo de sufocamento e de desespero em silêncio e em slow motion numa tensão assustadora e quase real. “Como Você É” é um filme forte, tocante e sem pieguice que coloca o adolescente para falar do seu jeito e da sua maneira, que assalta os ouvidos do espectador e pergunta ao final o que você acha e pede a sua versão de forma genial.

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Ganhador de Prêmio Especial do Juri do Festival de Sundance o longs tem atuações maravilhosas de três jovens: Owen Campbel de “Boardwalk Empire” (2010). Charles Heaton de “Stranger Things” (2016) e Amanda Stenberg de “Jogos Vorazes” (2012). Além de uma trilha sonora dual (lancinante e tocante ao mesmo tempo) assinada por Patrick Higgins. A fotografia é do cinegrafista de documentários Caleb Heymann e a edição – aspecto importante na forma narrativa escolhida – é de Abbi Jutkowitz em seu primeiro trabalho como titular de edição em longa-metragens, mas com uma boa experiência em equipes de edição de grandes produções como “X-men: Primeira Classe”. Aliás, “Como Você É” tecnicamente é um festival de profissionais que estão começando e se descobrindo  profissionalmente, como os adolescentes da história em relação às suas vidas.

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Em suma a produção americana dirigida por Miles Joris-Peyrafitte é um filme que merece ser visto com um olhar demorado. Um aspecto digno de atenção é o das metáforas, tanto a do armamento de uma sociedade quanto a do falo x carro , os dois símbolos de “macheza”: a natural e a construída. O filme não tem cenas pesadas, não é apologia a nada. É, simplesmente, um relato poderoso do processo de turbulência da adolescência no âmbito da descoberta da sexualidade no contexto de uma sociedade machista e homofóbica, sem usar essas palavras uma unica vez sequer. A classificação indicativa é de 16 anos, por conta da violência. “Como Você É” é poderoso e forte!

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  • Editado 11/12/2016

Sobre o Autor:

Editora do site Cinema & Movimento e crítica cinematográfica

Nenhum Comentário.

  1. Mariana Soto 27 de fevereiro de 2018 em 16:22 - Responder

    Outro filme com Charlie Heaton no elenco. Ele será um grande ator algum dia. Charlie Heaton esta impecável no filme Refém Do Medo. Ele sempre surpreende com os seus papeis, pois se mete de cabeça nas suas atuações e contagia profundamente a todos com as suas emoções. Não há dúvida de que muitas pessoas vão se lembrar dela como um Charlie Heaton filmes e programaAdoro porque sua atuação não é forçada em absoluto. Cada um dos projetos deste ator supera a minha expectativa. Eu sem dúvida verei novamente.

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