Cracolândia (Documentário); Pesquisa de: Heni Ozi Cukier; Direção: Edu Felistoque; Brasil, 2020. 87 Min.
Resultado de uma pesquisa extensa do cientista político Heni Ozi Cukier “Cracolândia” traz elementos fundamentais e ricos para uma reflexão séria sobre o uso do crack na Cidade de São Paulo. Das condições do uso ao contingente de usuários; das ações governamentais às ações de Organizações Não Governamentais (ONGs); do cenário apocalíptico recheado de violências ao exercício do poder paralelo no espaço da cracolândia de São Paulo; da promiscuidade entre o poder público e o crime organizado ao arrefecimento das leis referentes ao tráfico de drogas. Todas abordagens contundentes que não fogem à sua profundidade e que municiam a sociedade para o debate sobre a questão que, hoje, é mais que necessário.
O formato do longa é a composição de cenas da cracolândia de São Paulo juntamente com questões trazidas pelo pesquisador, respostas dadas por especialistas e autoridades como: psiquiatras, psicólogos, sociólogos, assistentes sociais, juízes, promotores públicos, secretários de estados como o de saúde e o de segurança, ativistas, coordenadores de programas de políticas antidrogas e viciados e ex-viciados. Enfim, um mosaico de perguntas, respostas e, mais que isso, de reflexões fundamentadas sobre a questão, que alargam o nível de conhecimento do espectador. E, ainda, nos traz experiências bem sucedidas de combate ao uso de drogas na Suíça, Noruega e Canadá através de conversas com os especialistas daqueles programas sobre contextos, procedimentos e quesitos. Não se satisfazendo com tamanha façanha ainda nos premia com uma analogia entre os tratamentos diferenciados exigidos por drogas diferentes (na Europa é a heroína e no Brasil o crack, drogas diferentes com efeitos diferentes que exigem tratamentos diferentes) a argumentação não tapa o sol com a peneira e faz-nos perceber o tamanho de nosso problema.
Edu Felistoque e Heni Ozi Cukier tocam na ferida sem medo e mexem em casa de marimbondo sem papas na língua. Conhecido por “Zagati” (2002) e “Toro” (2016), Felistoque se apropria do audiovisual, que é um instrumento de massa, para fomentar essa reflexão ao máximo de pessoas possível. Mais do que um livro, palestras ou um evento fechado sobre o tema, o cinema o espalha pelos quatro cantos do país e força a conversa, sendo um perfeito puxador de assunto. “Cracolândia” mostra em uma hora e meia uma ferida aberta que atinge uma sociedade inteira. Entre os aspectos trazidos para a reflexão está a possibilidade de pensar na causa. O que leva alguém àquele estado? O que está acontecendo com nossas sociedades? Onde e até que pontos somos também responsáveis? Um primor!
“Cracolândia” será exibido na plataforma SESC-Digital a partir de 29/10 às 20:00 hs e fica disponível até 04/11 na 44ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo.
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