Manchester à Beira-Mar (Manchester by the Sea) (Drama); Elenco: Casey Affleck, Michelle Williams, Kyle Chandler, Ben O’Brien; Lucas Hedges; Direção: Kenneth Lonergan; USA, 2016. 137 Min.
O filme americano dirigido e roteirizado por Kenneth Lonergan tira o espectador do conforto. Normalmente vamos ao cinema assistir uma história que traz possibilidades de reflexões positivas, de criticismos que nos ponham em movimento, por mais que enredo seja pesado. “Manchester à Beira-Mar” faz o contrário, nos estagna. O filme é uma jornada pelo fracasso e pela não-superação de traumas e dores. E versa sobre o cotidiano de um homem comum que depois de uma tragédia entra em isolamento e não luta para sair daquela realidade – que também é uma escolha mais comum do que imaginamos – e esse é o diferencial de “Manchester by the Sea” (no original), a abordagem. Lonergan escolhe versar sobre a tristeza e o isolamento chafurdando na lama do humano sem dela conseguir se libertar ou sequer querê-lo.
É uma ousadia e tanto fazer um filme com uma energia tão sombria. Até porque cinema é um produto comercial e pressupõem- se que tristeza e depressão não venda. Será?! O filme conta a história de Lee Chandler (Casey Affleck), um homem jovem, com uma família linda com três filhos, um irmão chegado, Joe Chandler (Kyle Chandler), um sobrinho querido, Patrick (Lucas Hedges) e com todas as recíprocas verdadeiras vivendo em Manchester (New Hampshire). Depois de uma tragédia sem precedentes na vida de Lee ele se muda para Minnesota, trabalha fazendo bicos e mora num quartinho minúsculo. Até que recebe a notícia de que seu irmão Joe falecera e de quebra que lhe deixara a guarda de seu sobrinho Patrick. Lee retorna a cidade para enterrar o irmão, mas vão ter que esperar até o inverno passar para a realização do sepultamento, pois o solo está congelado. Nesse ínterim, debaixo da dor do luto de um velório estendido a história se dá: a convivência com o sobrinho, as decisões a serem tomadas, a forma com a qual cada um vive esse momento à espera do sepultamento. As lembranças que o assolam e que para nós (espectadores) são peças do quebra-cabeças que vai se montando para entender a história de Lee. Com tragédia, traumas não resolvidos,relatos de dores e explosões de violência. Na verdade a trajetória de vida que Lee escolheu e as confissões de seus limites.
A abordagem escolhida por Kenneth Lonergan é válida e pouco convencional. Para acentuar esse veio escolhido, o diretor de “Conte Comigo” (2000) e roteirista de “Gangues de New York” (2002), que está em seu terceiro longa-metragem, foi cuidadoso na seleção dos aspectos que compõem esse mosaico e dão ênfase a esse viés doloroso. A época do ano escolhida para as filmagens – o inverno- o figurino, sempre escuro e sombrios com tons foscos. A escolha da própria cidade que tem uma arquitetura antiga e estática sem muita modernização; a trilha sonora barroca, assinada por Lesley Barber que amplia a sensação dramática – com destaque para a cena em que é executada “Adagio in G Minor” de Tomaso Albinoni inteira – e a edição de jennifer Lame de “Mistress America” (2015) que dão um refresco no ir e vir de memórias.
Os destaques vão para atuação de Casey Affleck de “O Assassinato de Jesse James pelo Covarde Robert Ford” (2007) – pelo qual foi indicado ao Oscar – e que conseguiu interpretar um indivíduo deprimido, isolado com dificuldades para expressão de pensamentos; e para a atuação de Lucas Hedges de “O Grande Hotel Budapeste” (2014). O filme ganhou prêmios respeitáveis, até então, dentre eles: o Globo de Ouro de melhor ator para Casey Affleck e de melhor roteiro das associações de críticos e está indicado ao BAFTA em seis categorias.
Depressivo “Machester à Beira-Mar” evoca o real na telona. O comum, o dia-a-dia de uma maioria na administração de suas dores. O filme quebra com a expectativa do brilho, da vitória, da superação e se estabelece com uma energia triste e nublada, muito bem desenhada pela fotografia de Jody Lee-lips. Para o que, possivelmente, se propositou – versar sobre a dor e os caminhos da não superação – é um produto competente. Mas, não deixa de contaminar o juízo de valor do espectador pela escolha do seu viés de abordagem. Agora se é comercial ou não é o Oscar e a bilheteria quem vão dizer.
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