‘Matrix Resurrections’ e a mudança de perspectiva

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‘Matrix Resurrections’ e a mudança de perspectiva

Por | 2021-12-24T13:44:20-03:00 24 de dezembro de 2021|Crítica Cinematográfica|0 Comentários

Matrix Resurrections (The Matrix Resurrections) (Ação/Ficção-científica); Elenco: Keanu Reeves, Carrie-Anne Moss, Yahya Abdull-Mateen II, Neel Patrick Harris, Jada Pinkett Smith; Direção: Lana Wachowski; USA, 2021. 148 Min.

Normalmente as sequência de boas obras cinematográficas vão de carona no sucesso da primeira. Às vezes se equivalem, na maioria das delas, não. Percebe-se na indústria audiovisual que as sequências são produtos mais comerciais do que artísticos. Foi assim com a trilogia Matrix, cujo primeiro longa (1999) foi um marco na História do cinema relativo a efeitos especiais. Neste contexto as expectativas de uma sequência da franquia ficam num patamar bastante baixo, gerando uma certa agonia sobre o que será possível se inventar de novo, num gênero cuja disputa pelo novo é marca registrada. O receio de se ver desconstruído tudo aquilo que foi um efeito de sentido tão único na experiência primeira é um fato. Mas, Lana Wachowski ( direção e roteiro) soube manter o arcabouço dessa construção dissipando toda tortura cinéfila antecipada. Manteve-se fiel à origem no teor filosófico existencialista acrescendo uma roupagem nova, contextualizada para uma geração de vinte anos depois da ideia original.

O roteiro de “Matrix Resurrections” é astuto quando muda a perspectiva da narrativa. Na trilogia, a perspectiva era a de Neo, a do mundo de Zion como realidade e a matrix, nosso mundo, como não realidade. O grande mote era colocar o espectador olhando o seu mundo como coisa falsa, irreal. Agora, a perspectiva é a de Thomas Anderson, a da Matrix como sendo real e Neo e Zion como virtual sem alterar o movimento principal, o do questionamento. A conexão entre esses dois mundos é feita por um psicanalista, os pontos em comum entre os dois mundos é o mundo dos games, e entre a trilogia original e Matrix 4 são as personagens e suas posições nesses mundos vistos da perspectiva da Matrix que completam esse quadro. Esses elos são bastante procedentes pelo viés artístico da obra, pelos aspectos filosóficos, e magistralmente costurados. Um ingrediente importante foi adicionado: o humor crítico, agradando aos filósofos existencialistas, aos cinéfilos de plantão e ao consumidor comum de filmes de ação e ficção científica.

O longa de Lana Wachowski soube se contextualizar para a geração que nasceu sob a égide da tecnologia do século XXI, soube atualizar os vinte e dois anos de distância do primeiro longa, soube trazer questões atuais de um jeito cool, soube elencar os questionamentos e conectar explicações artísticas sem perder o fôlego. Percebe-se uma ruptura entre o ator e sua obra, percebe-se a obra criando vida e questionando sua existência, sua criação e seu criador. O filme é uma conversa readaptada a seu tempo, uma recontextualização que virou argumento.

“Matrix Resurrections” manteve o designer, manteve a linha de raciocínio original da franquia adicionando-se camadas a ela, explica a possibilidade do que foi a trilogia para dar alicerce ao novo, faz um trânsito inteligente entre ‘realidade’ e ‘fantasia’ , usa bem os clichês e o estilo que designa a digital de alma da obra. Em suma, a mantém viva para um novo público. Não é igual ao primeiro? Não, não é. Mas, supera as expectativas quando se trata de sequência e ainda é mais alegre e hilária. Se a obra vai se perpetuar como obra cinematográfica…. é uma outra história. Mas, presume-se que esse não foi o objetivo. O que se pode afirmar, por uma perspectiva mais artística e filosófico-existencialista-irônico-satírica (viés que faz parte da digital de alma do longa) é que parece um Woody Allen num PS5 e dá vontade de ver de novo.

Sobre o Autor:

Editora do site Cinema & Movimento e crítica cinematográfica

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