O Jovem Karl Marx

O Jovem Karl Marx

Por | 2018-01-31T02:51:04-03:00 31 de janeiro de 2018|Crítica Cinematográfica|0 Comentários

O Jovem Karl Marx (Der Junge Karl Marx/Le June Karl Mark/The Young Karl Marx) (Biografia/Drama/História); Elenco: August Diehl, Stefan Konarske, Vicky Kriesps, Olivier Gourmet, Hannah Steele, Alexander Scheer; Direção: Raoul Peck; França/Bélgica/Alemanha, 2017. 118 Min.

Em tempos de polarização política no mundo todo, do retorno ao medo do comunismo de forma vazia, produzir e dirigir um filme sobre Karl Marx parece uma fronta. Mas, foi isso que Raoul Peck fez. Para entendermos melhor o filme, havemos de saber quem é o diretor, qual a sua abordagem e a contextualização da obra, para que possamos ter, minimamente, uma noção de para quê a obra se presta. Contextualizado na primeira metade do século XIX, “O Jovem Karl Marx” versa sobre o cotidiano do filósofo durante a escrita do Manifesto Comunista.

Raoul Peck é um cineasta haitiano, engajado políticamente, conhecido por “Eu Não Sou Seu Negro” (2016); “Abril Sangrento” (2005) e “Lumumba” (2000). Afeito a filmes de denúncia e defesa dos direitos das minorias*, Peck usa abordagens intensas e viscerais. Em “Le June Karl Marx” (no original) o cineasta passeia pela História da luta de classes tendo como agulha condutora os pensamentos de Karl Marx e Friedrich Engels, e o faz com competência: definindo conceitos de propriedade, corrupção, ideologia, revolução etc. Ancorado na obra de Pierre-Joseph Proudhon (1809-1865) “A Filosofia da Miséria” Raoul Peck faz citações de Montesquieu (1689-1755) e Hegel (1770-1831) e nos brinda com um desfile de teorias de Marx sobre o capital em forma da vida cotidiana  do próprio Marx com sua labuta pela venda de seus artigos, suas redes de amigos e suas conexões com os movimentos trabalhistas da época. O interessante é a forma sutil com a qual Peck homenageia Karl Marx. Numa produção francesa, a língua falada é o alemão.

Quanto as tecnicalidades o roteirista é Pascal Bonitzer de “Gemma Bovary: A Vida Imita a Arte” (2014), excelente em adaptação de diálogos, e a colaboração de Pierre Hodgson de “Sapatos Pretos” (1998). Aspectos a serem destacados são a direção de arte, o figurino e a fotografia, além das atuações. Na direção de Arte o cuidado na reconstituição da época ficou por conta de Merlin Ortner de “Phoenix” (2014) que juntamente com a figurinista Paule Mangenot de “Lola Pater” (2017) que optou por um guarda-roupas enegrecido que, com uma fotografia pastel, sem vida assinada por Kolja Brandt de “Naked Among Wolves” (2015) metaforizam bem o ponto de vista econômico da época pela perspectiva do proletariado. As atuações são um capítulo à parte, August Diehl (Karl Marx), conhecido por “Bastardos Inglórios” (2009) e “Viva a França!” (2015); Stefan Konarske (Friedrich Engels) de “Valeriam e a Cidade dos Mil Planetas” (2017) e Alexander Scheer (Wihelm Weitling) de “Lou” (2017), fazem um trabalho estupendo.

“O Jovem Karl Marx” é um mosaico teórico. A pegada é subjetiva e apresenta a genialidade de Marx na percepção das relações de produção, que ainda estavam se constituindo. E nos mostra o quanto ele era um visionário, um homem à frente de seu tempo. O filme apresenta a luta de classes por dentro e o reconhecimento deste movimento como luta. Por sua abordagem através de diálogos e sobre assuntos específicos, cujo nível de profundidade não é comum em filmes, ele seleciona público. Além de ser uma delicada homenagem a Marx. Para assistir é só acessar, está disponível online.


*expressão usada para caracterizar grupos que não são representados nos lugares de poder, embora sejam em valores absolutos, maioria.

Sobre o Autor:

Crítica cinematográfica, editora do site Cinema & Movimento, mestre em educação, professora de História e Filosofia e pesquisadora de cinema. Acredito no potencial do cinema para fomentar pensamento, informar, instigar curiosidades e ser um nicho rico para pesquisas, por serem registros de seus tempos em relação a indícios de mentalidades, nível tecnológico e momento histórico.

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