O Lobo do Deserto

O Lobo do Deserto

Por | 2018-06-17T00:15:41-03:00 20 de fevereiro de 2016|Crítica Cinematográfica|0 Comentários

O Lobo do Deserto (Theeb). (Aventura/Drama/Thriller); Elenco: Jacir Eid  Al-Hwietat, Hussein Salameh Al-Sweilhiyeen, Hassa Mutlag Al-Maraiyeh, Jack Fox; Direção: Naji Abu Nowar; Jordânia/Emirados Árabes Unidos/Qatar/Reino Unido, 2014. 100 Min.

A aposta da Jordânia para o Oscar 2016 é uma jornada de amadurecimento dentro de uma cultura ancestral – a beduína -. Ambientada na província Otomana de Hejaz, durante a primeira guerra mundial (1916); versado em árabe com sotaques característicos da tribo, “O lobo do Deserto” é uma junção estilística dos filmes de Akira Kurosawa e John Ford. E uma viagem sobre o uso dos instintos humanos básicos.

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Theeb (Jacir Eid) é filho de um xeque morto nos cotidianos dos conflitos das tribos por poços de água e regiões de pastagens – esses eram os embates comuns naquele contexto – que liderava uma tribo beduína no deserto da jordânia. Juntamente com seus dois irmãos vivem no deserto e são guias, pastores de criações e comerciantes esporádicos. Certa noite, surge no acampamento um oficial inglês, Edward (Jack Fox) acompanhado de um árabe local procurando por um guia que conhecesse o caminho de um determinado poço, pois lá se encontravam pessoas à sua espera. Os acertos são feitos e partem pela manhã: o inglês, seu amigo árabe e Hussein (Hussein Salameh), um dos irmãos de Theeb. O menino vendo-os partir, os segue. E depois de descoberto os acompanha na jornada.

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A questão do longa-metragem não é contar a história do inglês ou do que fazem ali, a questão é mostrar um cotidiano de aprendizagem. É uma espécie de jornada de iniciação de Theeb ancorados nos provérbios da cultura oral beduína. Não importa para o filme e a forma com a qual se escolheu contar essa história, quem são os personagens, de onde vêm, a que tribo pertencem, o que estão disputando ou quais sejam as questões envolvidas. O centro dela é o que acontece e como Theeb reage, o que ele aprende e como aprende.

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A locação foi o deserto da Jordânia, o mesmo de “Perdido em Marte” (2015); “Prometheus” (2012); “A Hora mais Escura” (2012) e “Guerra ao Terror” (2008). Também, o mesmo local em que viveu um grande herói da cultura beduína Awda Abu Tayeh e onde combateu na revolta árabe pelos mesmos arredores e mesma época, em 1916. E essas conexões não são casuais, elas se explicam pelas redes de formação e conhecimentos do diretor Naji Abu Nowar, um inglês/jordaniano de família militar que cresceu ouvindo histórias de guerreiros beduínos. E em seu primeiro longa-metragem faz uma radiografia da cultura local num estilo ‘western beduíno’ com tomadas abertas e panorâmicas que lembram as de John Ford no Monumment Valley e as hesitações silenciosas e longas residentes no olhar que lembram os filmes de Kurosawa.

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“Theeb” (no original) é a primeira indicação da Jordânia ao oscar. O filme foi dedicado a uma figura icônica da Jordânia, o artista plástico, arquiteto e grande incentivador do filme Ali Maher que faleceu em 2013. E já abocanhou um BAFTA (2016), o FIPRESCI do Festival de Filmes de Abu Dhabi (2014) e melhor diretor no Festival de Veneza (2014), dentre tantos outros. “O Lobo do Deserto” é um filme que em alguns aspectos, principalmente nas locações e na cultura, fazem lembrar “Timbuktu” (2014) de Abderrahmane Sissako. E ainda vem embevecido dos ensinamentos proverbiais, valorizando a cultura oral das tribos e a sua forma de aprendizado e transmissão.

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O filme de Naji Abu Nowa desenha a linha divisória da cultura nômade, livre, oral e genuína e a atual, quase sedentária. A invasão da modernidade na cultura beduína é bem metaforizada pelos trilhos do trem, pela chegada da ferrovia ( outro link com o western). O que o longa faz em seus 100 minutos é divulgar a cultura beduína e seus últimos suspiros de pureza. “O Lobo do Deserto” é uma radiografia do “modus vivendis” de um povo no poderoso suporte que é o cinema. “Theeb” faz do cinema outdoor para a cultura beduína…. e funcionou, tá no Oscar 2016.

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Sobre o Autor:

Editora do site Cinema & Movimento e crítica cinematográfica

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