‘O Problema de Nascer’ ficção-científica existencialista

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‘O Problema de Nascer’ ficção-científica existencialista

Por | 2020-10-20T21:24:37-03:00 20 de outubro de 2020|Crítica Cinematográfica|0 Comentários

O Problema de Nascer (The Trouble with Being Born) (Drama/Ficção-científica); Elenco: Lena Watson, Dominik Warta, Ingrid Burkhard, Simon Hatzel; Direção: Sandra Wollner; Áustria/Alemanha, 2020. 94 Min. #MostraInternacionaldeCinemadeSaoPaulo2020 #mostrasp #44mostra

Sandra Wollner, cineasta austríaca, juntamente com seu roteirista Roderick Warich, são os criadores de um filme de ficção-científica que faz pensar fora da caixinha. “O Problema de Nascer” conta um recorte de tempo na história de uma menina andróide de 10 anos, que tem com dono/pai um solitário que a usa para suas necessidades de pai, amigo e amante. Ali se aborda o território da não-ética do ser humano, em que as normas e regras sociais e do políticamente correto não se aplicam.

Elli, (Lena Watson) é um andróide de Inteligência Artificial (I.A) que sente saudades, sente fome, chora, tem pesadelos e curiosidades em relação ao mundo dos humanos. Porém, é uma propriedade, pertence ao pai (Dominik Warta). Certo dia, curiosa para saber sobre o mundo foge de casa. É encontrada por Toni (Simon Hatzl) que resolve reconfigura-la e dá-la de presente à sua mãe (Ingrid Burkhard) como companhia. Nessa nova vida ela passa a ser o que a necessidade da senhora octogenária dita: um irmão falecido há 60 anos, o que mistura todas as suas memórias.

O argumento do filme é fora da caixinha… Se você tivesse um artefato I.A, o que ele seria para você? Do que você faria ele? versando sobre o que o ser humano é, partindo do princípio de seus usos para quem nada é dentro do contexto em que vive. Divagar dentro da ficção-científica sobre filosofia existencial é um feito e tanto, se levarmos em consideração que o mote do gênero são os efeitos especiais, a direção de Sandra Wollner o torna quase didático. A ausência de diálogos, sem a necessidade de divagações filosóficas à la Woody Allen, é um primor. As cenas que polemizam as possibilidades de usos são a tônica do roteiro. “The Trouble With Being Born” (no original) nos remete aos programas de registros de experiências de vida postos em outros corpos vistos em “Altered Carbon” (série de TV) que trabalha brilhantemente com um mundo futurista distópico. Os usos de metáforas imagéticas em que três naturezas perambulam juntas pela estrada da vida (o cão, a velha e o andróide) pode se dizer que são a síntese da obra.

A frase no casaco de Elli, ao fugir e casa “Nature is the Future” nos situa onde, possivelmente, Sandra Wollner e Roderick Warich quiseram nos levar como espectadores. Wollner é conhecida na Áustria por seu primeiro filme “Das Unmögliche Bild” (2016), premiado em quatro festivais mundo afora; Warich, roteirista alemão, oriundo de séries de TV, é conhecido pelo seu trabalho premiado no Festival de Varsóvia, “2557” (2017). Juntos, com uma experiência artística cinematográfica de iniciantes, mas bastante competente, trazem para o público questões polêmicas a serem pensadas, a partir de algumas perspectivas: a filosófica, a psicanalítica, a educativa e a histórica, em relação ao caminhar da humanidade, enquanto tal.

“O Problema de Nascer” faz parte da 44ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo e compete na seção Novos Diretores. O longa foi seleção oficial no Festival de San Sebástian; recebeu o prêmio Cinema Extraordinário no Bergen International Film Festival; Prêmio especial do juri na Mostra Encounters no Festival de Berlim; Melhor filme no Romy Gala da Áustria; Grande prêmio, melhor ator para Dominik Warta, melhor edição e melhor roteiro no Diagonal Film Festival da Áustria.

Em suma, o filme pensa fora da caixinha dentro do gênero ficção-científica, tem um roteiro intrincado e inteligente, uma edição primorosa sob a batuta de Hannes Bruun e uma fotografia lúgubre, escura e mórbida, que pinta um painel distópico do futuro da humanidade, dirigida por Timm Kröger. “O Problema de Nascer” é um diamante entre tantos outros de vários quilates que serão exibidos na Mostra de São Paulo.

  • filmes assistido em cabine no dia 14/10/2020 da Mostra Internacional de Cinema de São Paulo. #mostrasp #44mostra

Sobre o Autor:

Editora do site Cinema & Movimento e crítica cinematográfica

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