‘O Som do Silêncio’ – um show de tatibilidade

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‘O Som do Silêncio’ – um show de tatibilidade

Por | 2021-03-30T07:18:21-03:00 30 de março de 2021|Crítica Cinematográfica|0 Comentários

O som do Silêncio (Sound of Metal) (Drama/Música); Elenco: Riz Ahmed, Olívia Cooke, Paul Raci, Mathieu Amalric; Direção: Darius Marder; EUA, 2019. 120Min.

Walter Benjamin em seu livro “A Obra de arte na era de sua reprodutibilidade técnica” chama de tatibilidade o advento de um artefato cultural – o cinema em particular – provocar no espectador a potencialização dos sentidos, toma-lo de assalto, penetrar através de seu aparelho perceptor de uma forma contundente e leva-lo a outro lugar dentro de si mesmo. “O Som do Silêncio” de Darius Marder faz isso com o espectador de forma brilhante, quando lhe dá a possível sensação do processo de surdez, com uma mixagem de som que merece reverência. Traz, também, para reflexão a potencialidade da audição, a possibilidade de adaptação a um mundo novo que interage com o ‘mundo velho’ e a importância da aceitação de algo para viabilizar uma superação.

O roteiro se detém na história de Ruben (Riz Ahmed), um baterista que, em plena turnê, é diagnosticado num processo de surdez acelerado. Neste contexto, o músico tem que aprender a lidar com a situação escolhendo entre duas possibilidades: inserir-se no mundo dos deficientes auditivos, aprendendo uma língua nova , socializar com pessoas que tem a mesma deficiência prendendo a ver o mundo de outra forma, senti-lo de maneira diferente da qual estava acostumado e renunciar a sua carreira; ou realizar uma operação de implante para a recuperação da audição. Esses dois mundo têm valores diferentes no que diz respeito às relações humanas e À audição . Esses dois processos são os viéses de abordagem do longa-metragem dirigido pelo americano Darius Marder e roteirizado por Abraham Marder. Juntos eles costuram a diferença de caminhos e de atitudes entre a aceitação e a resistência.

O que se destaca em “O Som do Silêncio” são as atuações de Riz Ahmed de “Rogue One: Uma História Star Wars” Paul Raci (joe), seu mentor. Conhecido pela série de TV “Goliath” que se sustentam entre si e ao roteiro do longa; a participação especial de Mathieu Amalric de “Os Fantasmas de Ismael” e o som, que é um personagem na história. O filme está concorrendo ao Oscar da categoria pela sua mixagem, primor e riqueza de nuances relativo ao processo de surdez levando o espectador a uma embriaguez auditiva sensacional. Essa experiência é a tatibilidade a qual me refiro, o despertar de um sentido se elevando em relação aos outros no processo de ‘contação’ dessa história e que entre os candidatos ao Oscar na mesma categoria – “Greyhound”; “Mank“; “Relatos do Mundo” e “Soul” – me atrevo a dizer que “O Som do Silêncio” se destaca de forma sem igual

Outro aspecto a ser analisado, em relação Oscar desse ano, no que tange o longa de Darius Marder, é a diversidade. Seja ela de raça, nacionalidade e filosofia religiosa a edição 2021 está ousada como nenhuma outra. Riz Ahmed é muçulmano e é o primeiro ator a ser indicado ao prêmio da categoria, e em qualquer outra, em 93 anos de existência da premiação. Com todo o contexto político mundial relativo à vertente religiosa, que remete o consciente coletivo à facções como o ISIS e o recrudescimento cultural em países do oriente médio, confundindo e misturando aspectos que isoladamente se encavalam. essa indicação traz para um lugar de honra e de destaque, no mundo ocidental, essa desmistificação. Só a indicação já vale o prêmio. Mas, o favorito da noite é Chadwick Boseman por “A Voz Suprema do Blues”, no qual está imbatível. O filme ainda concorre às categorias de: Filme do ano, ator coadjuvante para Paul Raci, roteiro original e edição.

“O Som do Silêncio” aborda aspectos filosóficos sobre deficiência física e traz em seu roteiro o processo de desenvolvimento de novas habilidades. Seu viés é o de uma nova oportunidade de ver o mundo. A metáfora do som limpo captado pelos ouvidos e recebido por nossas almas e o som artificial, metálico, ruidoso e frio produto de uma resistência é muito bem pontuada. “Sound of Metal” (no original) preconiza que a percepção de mundo vem da alma, os sentidos são somente instrumentos que podem ser readaptados a uma nova realidade. Um excelente personagem conceitual para pensarmos os processos de superação. O longa está disponível na plataforma streaming Amazon Prime Vídeo.

Sobre o Autor:

Editora do site Cinema & Movimento e crítica cinematográfica

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