Que Mal Eu Fiz a Deus?

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Que Mal Eu Fiz a Deus?

Por | 2018-06-17T00:01:15-03:00 7 de agosto de 2015|Crítica Cinematográfica|0 Comentários

Que Mal Eu Fiz a Deus? (Q’est-ce qu’on a fait au Dieu?). (Comédia); Elenco: Christian Clavier, Chantal Lauby, Pascal N’Zonzi, Ary Abittan, Medi Sadoun, Frédéric Chau, Noom Diawara; Direção:  Philippe de Chauveron; França, 2014. 97 Min.

Com distribuição proibida nos Estados Unidos e na Inglaterra, pasmem, em pleno século XXI, “Que Mal Eu Fiz a Deus?” de Philippe de Chauveron aborda, sem dó, piedade ou panos quentes, o racismo. Isso mesmo, todos os assuntos e piadas que são postos para debaixo do tapete, no longa francês, são expostos e dissecados com muita graça, coragem e sem se tornar pesado. E, possivelmente, aí está o mote da obra cinematográfica, pois ela expõe o ridículo do preconceito, a sua incoerência e a inutilidade da criação/invenção de nichos de importância, brincando e fazendo rir à vera.

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Premiado com o Emden Film Awards para Philippe de Chauveron, com Lumière de melhor roteiro e indicado ao Goya de melhor filme europeu, “Que Mal Eu Fiz a Deus?” conta um momento na vida família Verneuil, os casamentos das filhas. Caucasianos, católicos, burgueses e consumidores de cultura quatrocentista, o casal Verneuil Claude (Christian Clavier) e Marie (Chantal Lauby) veem as filhas se casarem com homens de culturas distintas e rivais entre si. Odile (Julia Piaton) se casa com um judeu, Davi Benichou (Ary Abittan); Isabelle (Frederique Bel) com um árabe Rachid Benassem (Medi Sadoum); Segoléne (Emile Caen) com um chinês, Chao Ling (Frédéric Chau). A esperança da família, incluindo das irmãs e dos cunhados, é  que Laure (Elodie Fontan) se case com um católico, francês, burguês e tal. Laure, então, apresenta o homem com quem já vive escondido, pois decidem se casar: um negro, Charles Koffi (Noom Diawara). As famílias vêm abaixo, inclusive a de Charles, pois seu pai, André Koffi (Pascal N’Zonzi) é totalmente contra. O desenrolar dessa história se dá nos preparativos para o casamento, num show de diálogos inteligentíssimos e procedentes para o contexto e com piadas políticas e cinematográficas impagáveis.

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Philippe de Chauveron, juntamente, com Guy Laurent roteirizaram o longa que tem uma abordagem merecedora de aplausos, pois o nicho em que as questões são postas diminui seu impacto, mas não dilui o preconceito: o contexto familiar. Como é um espaço de afeto e as situações são todas cotidianas como: almoço em família, nascimento de netos, jantar de natal, a missa na igreja, a brincadeira séria toma corpo com graça. O conjunto da obra faz pensar sobre a tolice da homogeneização e, preconiza e ovaciona a grandiosidade da heterogeneidade. E isso também é metaforizado na trilha sonora assinada por Marc Chouarain de “Respire” (2014), que faz um mix de culturas com canções como: “Dead Wrong” de Hanni El Khatib; “Le Grand Rabbi” de Vladimir Cosma – da trilha sonora original de “As aventuras de Rabbi Jacob (1973); “Douce France” de Charles Frenet; “Zumba He Zumba Há” de Mouner Belkhir – um remix – e a “Marseillaise”, é claro, cantada em capela pelos genros (Bárbaro!). Mas com tudo isso quem rouba a cena são Christian Clavier, ator francês com duas indicações ao César, e Pascal N’Zonzi, ator franco-congolês de “Lumumba” (2000), que estão soberbos.

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“Que Mal Eu Fiz a Deus?” é um achado de muita coragem do cinema francês, pois além de tocar em preconceitos de forma geral, dá um tapa com luva de pelica  nos calos da sociedade francesa. O longa de Philippe de Chauveron, possivelmente, nos diz que o espaço de interseção entre nós não é  a nobreza, mas o defeito, a imperfeição. O que temos em comum na raça humana é o não-louvável e enfatiza essa igualdade na ‘turronice’, na desconfiança, no preconceito, no medo de se relacionar, na criação gratuita de barreiras e na necessidade de união para se resolver as questões em comum e que, independente das diferenças, dá para sermos felizes juntos. O lema do proibido longa francês é : a heterogeneidade é a argamassa que nos une. Estupendo!

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Sobre o Autor:

Editora do site Cinema & Movimento e crítica cinematográfica

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