‘Star Wars 9’ a derrocada de uma franquia

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‘Star Wars 9’ a derrocada de uma franquia

Por | 2019-12-31T18:58:12-03:00 29 de dezembro de 2019|Análise cinematográfica, Crítica Cinematográfica|0 Comentários

Star Wars: Ascenção Skywalker (Star Wars: Episode IX -The Rise of Skywalker) (Ação/Aventura/Fantasia); Elenco: Daisy Ridley, Adam Driver, John Boyega, Oscar Isaac; Direção: J.J. Abrams; USA, 2019. 142 Min.

Chega ao fim a saga de uma das franquias mais antigas do cinema e uma das mais lucrativas. Aquilo que se temia quando da revitalização da franquia depois da venda para a Disney, com o episodio 7 (“O Despertar da Força”/2015) e que não aconteceu, caiu em nossas cabeças agora, no episódio 9 – a saber a descaracterização de uma das sagas mais poderosas do cinema. Espera-se sempre um final grandioso para uma jornada grandiosa. “Star Wars” teve muito mais portentosidade em sua primeira trilogia (” Uma Nova Esperança”/1977; “O Império Contra-ataca”/1980 e “O Retorno do Jedi”/1983) do que nas outras duas trilogias. Seja por ter apresentado novidade no formato, no tipo de história mitológica transposta para a contemporaneidade, pela quantidade de personagens e de mundos; seja pela criatividade e efeitos especiais que estavam ensaiando no cinema e ainda eram bastante artesanais. A saga se firmou, tomou corpo, conquistou fãs e virou quase religião.

Como qualquer produto comercial ,o objetivo é continuar gerando lucros e “Star Wars” nesse ponto tem o pioneirismo no lançamento de produtos derivados. De action-figure a games, de fantasias originais de seus personagens a parque temático. E quando se pensou que tudo havia acabado, surge o prequel. A segunda trilogia (“A Ameaça Fantasma”/1999; “Ataque dos Clones”/2002 e “A Vinganças dos Sith”/2005) que vem explicar toda a história do personagem mais poderoso da saga…Darth Vader. E ainda gerou muitas reações de fãs nos cinemas e fora dele. Não satisfeitos produtores da Disney – novos donos – com as bençãos de seu criador, George Lucas, decidem contar a história da geração seguinte a de Luke Skywalker e deu no que deu. “O despertar da força” injetou um gás a mais nos fãs, ressuscitou, literalmente, a esperança de que com novas ideias, tecnologias, personagens, com a direção competente de J. J. Abrams e em cima de uma história consolidada se revitalizasse a saga. “Os Últimos Jedi” (2017) não foi essa proeza toda. Trocou-se o diretor, matou-se o Luke, Manteve-se a Leia, que tinha todo um contexto para ser morta como heroína em combate e ficou o mistério: Quem é Rey? Essa resposta era o motivo de “A Ascenção Skywalker” existir. E o que fizeram? desequilibraram a força e tiraram todo o sentido maior da saga inteira. O mal acabou, o bem se estabeleceu de vez e o equilíbrio foi para o brejo. Preocupação essa que pairou nas duas trilogias anteriores e que simplesmente foi esquecida nessa, acabando como qualquer filminho esquecível de sessão da tarde. Mas, o que pode ter acontecido, olhando aqui de fora?

O primeiro viés de análise vem da própria linha de raciocínio da saga. Darth Vader era o equilíbrio da força, Já que o bem reinava na República com a rainha Amigdala/Padmé (Natalie Portman). Palpatine (Ian Mcdiarmid), o líder do senado, tinha suas conexões com o mal, porém ainda não tinha um guerreiro que representasse esse mal e tomasse o poder, para formar a resistência, que é o lugar dos Skywalker. Logo, faltava o mal personificado – como o eram o Jedi em relação ao bem – para equilibrar a força. O viés, então, era esse: Anakin Skywalker (Jake Lloyd) seria o guerreiro que se tornaria Darth Vader. Por isso tão rechaçado por Yoda, que o pressentia. De Vader viriam Léia (Carrie Fisher) e Luke (Mark Hamill). Léia deu origem a Kilo Ren (Adam Driver) de sua relação com Hans Solo (Harrison Ford) e o mais óbvio é que Rey (Daisy Ridley) fosse filha, mesmo que não reconhecida, de Luke Skywalker… Mas, NÃO. Dão outra origem a Rey. Uma origem sem lógica, sem explicação, sem sentido. E tiram um Skywalker do nada. Se essa tática foi para dizer para o espectador que um herói, um Jedi, pode ser qualquer um, para gerar identificação com o público. Não funcionou. Ficou um buraco de descrença, de falta de credibilidade na história e uma espécie de sensação de ter sido enganado. O segundo viés foi a pressa em resolver questões, por exemplo, como o papel de Poe Dameraon (Oscar Isaac) como lider da resistência, sem o menor zelo ou atenção de forma atabalhoada, gerou uma sensação de trabalho mal acabado. De desleixo e de desconsideração com a saga que, para alguns marcou a geração como cinéfilo. Foi quase uma ofensa. Um sacrilégio. Esses nós, imensamente importantes na história toda e que foram desconsiderados e mal amarrados, são responsáveis pela desconforto causado por “A Ascenção Skywalker”. Nas exibições em nenhum momento a platéia reagiu, foi de uma apatia sem precedentes

Exemplo de que se pode fechar redondinho uma saga longa temos em “Os Vingadores”. Cada detalhe criado durante 10 anos de exibição de longas de personagens que viriam a fazer parte do grupo que salvaria o Universo do super vilão Thanos, foi milimetricamente calculado e conectado surpreendendo por tamanho detalhismo. Dois exemplos para fundamentar o raciocínio: em “Vingadores” (2012) na batalha ápice do longa, Thor (Chris Hemsworth) em algum momento para tudo, olha para um lado e para o outro e diz…quê? e entendemos isso como uma piada, um chiste, uma brincadeira. Em “Vingadores: Ultimato” (2019) temos a resposta do que aconteceu para que Thor tivesse aquela ação. E, é simplesmente genial! dando a entender que tudo até o ultimato já estava planejado e o que havia ali era somente uma tessitura. Outro exemplo, Em “Homem-Formiga e Vespa” (2018) depois do resgate da cientista Janet Van Dyne (Michelle Pfeifer) o estalar de dedos de Thanos em “Os Vingadores: Guerra Infinita” (2018) atinge-os numa conexão de acontecimentos na linha do tempo e explicação da ausência de Homem-Formiga em Guerra Infinita, brilhante. Essas ligações entre os filmes, entre as histórias, com objetos, atos e consequências é sensacional e muito competente. O que nos mostra o cuidado, a meticulosidade e o preciosismo da equipe de roteiristas da Marvel. E mais ainda, que é possível fazer isso muito bem feito. É por isso que a Marvel tem na sala de cinema quase que uma torcida do Corintians. O detalhe é que a Marvel também é da Disney….. Então ficamos a imaginar que tudo não passou de falta de consideração mesmo. Como produto enquanto gerador de recursos, enquanto representante cultural de uma geração inteira e com o público que é quem sustenta toda essa indústria.

Sabemos que a franquia Star Wars não vai falir por conta disso. Mas, é triste ver um produto imaterial e de fomento ao imaginário popular, com o alcance desse nível ser tratado dessa forma, com diálogos pouco elaborados, com muita repetição de quadros e remetências a takes, que são a assinatura da franquia, mas que ficou como preenchimento de alguma coisa que faltava. Como exemplo: a cena da corrida na areia, constante em “Ameaça Fantasma”. As subidas em penhasco e fraturas como as de Luke Skywalker em ” O retorno de Jedi” e a de Hans Solo em “O Despertar da Força” antes de ser morto por Kilo Ren. As batalhas intergalácticas cujos takes só se repetem a ponto de perder a graça. A falta de criatividade foi tanta que nem parece que é o mesmo diretor de “O Despertar da Força”, conhecido por “Lost”, “Star Trek” e “Missão Impossível III”. O mesmo diretor que no episodio VII levantou o cinema quando todos estavam apreensivos que de uma nova trilogia fosse acabar de vez com a saga. Pois é, quando já havíamos adquirido segurança, eis que o grande mal sobreveio…e não foi Palpatine, nem Darth Vader ou Kilo Ren que, diga-se de passagem nunca chegou aos pés de seu avô… foi um dos sete pecados capitais mesmo…. a PREGUIÇA. Uma pena!

Sobre o Autor:

Editora do site Cinema & Movimento e crítica cinematográfica

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