Terceira Pessoa (Third Person). (Drama/Romance); Elenco: Liam Neeson, Mila Kunis, Adrien Brody, Kim Basinger, Olivia Wilde, James Franco, Maria Bello; Diretor: Paul Haggis; Bélgica/USA/França/Reino Unido/Alemanha, 2013. 137 Min.
Depois de uma tragédia familiar acontecida em sua vida, Michael (Liam Neeson), abandona sua casa e mulher e vai para Paris – a cidade luz- se esconder no escuro de um apartamento de hotel, perturbado pela culpa, para escrever um livro catarse que o ajude a superar o insuperável. Este é o estopim para uma história bem intrincada que Paul Haggis, além de dirigir, roteiriza para o seu mais recente filme “Terceira Pessoa”.
A história de simples tem nada. A narrativa é costurada por três histórias que compõem o livro de Michael, em que o paradoxo está presente o tempo todo, (claridade versus escuridão, água como signo de vida e de morte, realidade versus fantasia) e todas têm um elo fortíssimo – a terceira pessoa – que é o cerne da tragédia a ser superada. O mote da obra de Paul Haggis é descobrir onde está Michael nas histórias que conta, pois em cada uma delas ele mostra um pedaço de sua alma e de sua dor, na selva de palavras. O alinhavo entre a fantasia e a realidade são os telefonemas de sua mulher Elaine (Kim Basinger), cuja vestimenta é outro signo importante para entender a história.
“Terceira Pessoa” é um romance psicológico com cara de pot-pourri de histórias cotidianas. Mas, a cereja do bolo é a forma de contar essa história. Paul Haggis brinca com a nossa maneira linear e fossilizada de vermos filmes, lermos e contarmos histórias. Todos os caminhos são de engano, o título evoca um triangulo amoroso, não é. O roteiro induz o espectador a achar que as histórias são reais, quando são partes de um livro fictício, desvencilhando a atenção daquilo que importa, de propósito. Os Plot Twist, não são Plot Twist, são véus que já estão lá desde o início, a história já está dada, eles são o processo de expurgação da dor de Michael, e que o espectador não percebe pela maneira sui generis da história ser contada. Michael, na escrita do livro, monta um quebra-cabeças de fantasia, em que o real é a agulha no palheiro e quem a procura somos nós, sem saber pelo que estamos procurando. Dentro das histórias inventadas está a terceira pessoa, que além de estar presente/ausente, também se imiscue à pessoa do discurso ( terceira pessoa do singular). Ele joga com o leitor, faz um pique-esconde de dar gosto, e monta uma grata armadilha àquele que costuma ver tudo de um mesmo lugar e sob o mesmo ângulo. Ele desloca o leitor, assim como Haggis faz com o espectador. “Terceira Pessoa” é um jogo de “contação” de histórias como um conjunto de bonequinhas russas. E faz uma dança com os pedaços que exclui o escritor, só para conectá-los no final. Na realidade até o ritmo das histórias acompanha o ritmo do ânimo do escritor que é acelerado quando ele é chamado à realidade pelo telefonema de sua mulher. “Terceira Pessoa” não segue uma linha de logicidade, pois a realidade e a fantasia estão imbricadas e o maior contexto é o da fantasia, exigindo do espectador que encontre o ponto de realidade, quando nós estamos acostumados ao contrário.
O filme de Paul Haggis é uma desconstrução no modo de contar histórias extraordinário. Dá um nó na cognição de todos nós. Nos surpreende sem perder o fio da meada no caminho escolhido. Comparável ao estilo de contar a histórias e ao desfecho final de “Os suspeitos” (1995) de Bryan Singer, em que por mais que o espectador preste atenção tem uma surpresa procedente no final. Tudo isso numa linha de concentração absoluta por mais de duas horas. E é aí que mora o desvio, o filme seleciona público, não é uma mera distração, é um Puzzle. Assim como “Birdman” seleciona público pela sua erudição, “Terceira Pessoa” seleciona pela capacidade de concentração, saindo completamente fora do arcabouço comum da forma de se contar histórias.
Não é para menos, Paul Haggis foi roteirista do filme “Menina de Ouro” (2004) dirigido por Clint Eastwood, que ganhou o Oscar de Melhor filme e, roteirista de “Crash – No Limite” (2004) pelo qual ganhou o Oscar da categoria. A trilha sonora, a fotografia, a edição, a produção de um pool de países como a Bélgica, USA, França, Reino Unido e Alemanha, dão um nível de visibilidade e chancelam uma qualidade. A atuação dos atores de peso como Kim Basinger, Adrian Brody, James Franco e Olivia Wilde são adendos importantes, mas nada bate essa maneira espetacular de narrativa.
Em suma, “Terceira Pessoa” é outro filme High Level da leva de estreias 2015, e é para ser visto, pelo menos, duas vezes para não restar dúvidas. Bárbaro! Espetacular! Brilhante! Extraordinário!
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