Refugiados, liberdade feminina, violência e limitações humanas. Todos assuntos de cinema

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Refugiados, liberdade feminina, violência e limitações humanas. Todos assuntos de cinema

Por | 2018-06-17T01:08:49-03:00 26 de outubro de 2017|Mostras e Festivais|0 Comentários

Entre os filmes que chamaram a atenção do mundo esse ano estão o sueco “The Square” (Palma de Ouro no Festival de Cannes) e  Georgiano”Scary Mother ( melhor primeiro filme no Festival de Locarno). Entre os assuntos que estão em voga no mundo, o caso dos refugiados com “Pescadores de Corpos” e a violência com “Praça Paris”. E para não dizer que não se falou de flores (ironia), um pouco de história através do olhar de quem viveu a Guerrilha do Araguaia com “Soldados do Araguaia” de Belisario Franca.  Confira as primeiras impressões do Blog Cinema e Movimento!

Pescadores de Corpos de Michele Pennetta. Suíça, 2017, colorido, 70 Min. (documentário).

O longa-metragem passeia pela questão da chegada de  refugiados ao litoral italiano e faz um contra-ponto com os imigrantes que chegam e o barco clandestino de pescadores que os resgatam. Durante a exibição somos apresentados a um imigrante sírio que depois de resgatado mora no cais, em uma embarcação desativada e com um cotidiano de luta para se inserir no mercado de trabalho e legalizar sua situação no país, acompanhamos sua solidão e seus conflitos. Como também acompanhamos a tensão de um grupo de pescadores clandestinos e sua rotina de fuga da guarda costeira e de pesca para sobrevivência sempre de olho no tempo e nos barcos com imigrantes ilegais que passam por eles no mar, na verdade,eles os procuram, por saberem que são muitos e estão em uma situação de completa vulnerabilidade. O filme é uma produção da suíça e é dirigido por uma mulher que, com muita calma, conversas e silêncios nos dá uma amostra da nova realidade do movimento do mundo.

 
The Square de Ruben Östlund. Suécia/Alemanha/França/Dinamarca, 2017, colorido, 142 Min. (ficção)

“The Square” é um produto de qualidade, um luxo. Com uma história cotidiana, cheia de camadas e inteligente, o filme foi o vencedor do Festival de Cannes desse ano.  O argumento é simples: a tentativa de recuperação de um celular e uma carteira roubados, que abra um leque de possibilidades de análises do humano (posição social, estereótipos, expectativas de papeis construídos por um imaginário social, a discussão sobre a liberdade da arte, o limite da arte, se ela tem ou não limites, e os limites medíocres do ser humano. Possivelmente, o cerne da questão é esse, Ruben Östlund dirigiu um longa afortunado pela possibilidade construída competentemente e muito bem alinhavada de primorosas discussões. Estrelado por Claes Bang que interpreta Christian um curador de um museu famoso e que é o centro que irradia todas as questões, por sr curador de arte, por ser o dono do celular que some e seu personagem ser inteligente o suficiente para ser o cicerone dessa aventura filosófico-existencialista altamente crítica. Na realidade, é uma sociedade que se auto-analisa. O longa é muito mais do que pesa e,é o tipo de filme em que, cada vez que o espectador o vir, vai enxergar mais coisas e todas elas diferentes entre si e conectadas. Por tal tem classificação etária, para evitar ‘censura’.

Crítica completa (Aqui!)
 
Mulheres Divinas de Petra Volpe. Suíça, 2017, colorido, 96 Min. (ficção)

Todos nós conhecemos a História da liberação feminina da França, da Inglaterra, dos Estados Unidos, do Brasil etc. E da Suíça? Pois é. O cinema também serve para isso, ampliar horizontes e aumentar a nossa rede de significações e de produção de conhecimentos. A cineasta resolveu contar como foi a luta pelo sufrágio feminino na Suíça na década de 70. Sim, bastante tardio. O que surpreende-nos no contar da história é a radiografia da mentalidade dos cidadãos suíços. O espaço é um vilarejo distante de Zurique e que desconstrói o nosso imaginário social de maturidade política e gregária, dentro do contexto de um país com um Índice de Desenvolvimento Humano tão superior aos demais. Mas a abordagem de Petra vai além da política, passa pela auto-estima, o autoconhecimento com uma sutileza, graça e delicadeza que envolve o espectador e mistura isso com o exercício da cidadania e de existência. “Mulheres Divinas” se conecta perfeitamente com “As Sufragistas”.

Crítica completa (Aqui!)
 
Scary Mother de Ana Urushadze. Georgia/Estônia, 2017, colorido, 107 Min. (Ficção)

As produções do leste europeu são, basicamente, cultas, com um nível de abordagem bastante subjetivo e com aquela fotografia fosca que é caracterizadora da gramática cinematográfica da região. Nesta a história é intensa. Uma dona de casa e mãe de dois  filhos que tem uma veia talentosa para a literatura, resolve expulsar suas angustias escrevendo e produz um obra assombrosa sobre como vê a própria família. Ela acaba com o marido, os filhos e os pai, sempre usando metáforas terrorosas e horrendas. Todos acham que ela enlouqueceu e têm medo dela,menos seu editor que a acha um gênio. Mas que também não é lá tão bom da cachola, sendo uma versão light de Norman Bates. O cerne da questão é discutir a limitação que a formatação da sociedade impõe às mulheres, os preços que se tem que pagar pelo próprio desenvolvimento e exercício de talentos. Debaixo de um humor fino e irônico, muito característico da, outrora, terra de Dostoiévski, vale o ingresso duas vezes.

 
Soldados do Araguaia de Belisário Franca. Brasil, 2017, colorido e P&B, 73 Min. (documentário)

Muito se ouve falar da tal Guerrilha do Araguaia. Muito se tem visto de abertura de arquivos da época do regime militar para mostrar a realidade daquele recorte de tempo. Sempre se dá vez e voz para as vítimas como em “Orestes” que promove uma verdadeira terapia com as vítimas de tortura, mas não costumamos ouvir os torturados do outro lado do balcão, e possivelmente, sequer sabíamos que existiam. Belisário Franca, com a fundamentação de uma pesquisa respeitável foi atrás dos soldados locais – os ribeirinhos – que foram recrutados pelo Exército Brasileiro à época para colher depoimentos e relatos sobre o pesadelo que foi a Guerrilha do Araguaia: 4.000 homens armados até os dentes com armas potentes contra 73 guerrilheiros do Partido Comunista Brasileiro no meio da região amazônia ao longo do Rio Araguaia, com revólveres calibre 38 e usando, como bucha de canhão os jovens recrutas locais, que ao se alistarem eram convocados. A obra cinematográfica se divide em entrevistas com esses soldados, hoje senhores sexagenários em fotografia colorida e as imagens de arquivo todas em P&B. A narrativa é feita pelos próprios soldados. Indispensável para quem tem um mínimo de vontade de se informar para não desejar ditadura nunca mais.

 
Praça Paris de Lucia Murat. Brasil, 2017, colorido, 110 Min. (ficção)

A documentarista Lucia Murat é conhecida por “A Memória que me Contam” dessa vez resolveu mostrar a sutileza dos tentáculos silenciosos da violência com nuances e intensidades diferentes. O contexto é a realidade brasileira, mais especificamente a da cidade do Rio de Janeiro e usando o viés do olhar feminino, da vivência feminina. A cineasta traça um apinel sobre como a violência de dentro de casa cresce e se agiganta no indivíduo e cria uma sociedade doente e como a violência da sociedade invade a vida pessoal e psíquica do cidadão. Com uma abordagem bem conhecida do carioca, com as nuances bem típicas da violência velada e a escancarada do Rio de Janeiro o longa é uma viagem pela cidade e pelo indivíduo. As locações são a Universidade do Estado do Rio de Janeiro, o Morro da Mangueira, o bairro do Leblon e o litoral português. Numa alusão, possivelmente, à praça do bairro de bonsucesso  e uma remetência à capital das luzes e cidade luz  “Praça Paris” é mais uma to de coragem e inteligência dessa mulher e profissional admirável.

#Mostrasp
 
 
 

Sobre o Autor:

Editora do site Cinema & Movimento e crítica cinematográfica

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