Entrevista Coletiva: “Muitos Homens num Só”

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Entrevista Coletiva: “Muitos Homens num Só”

Por | 2018-06-16T23:57:58-03:00 27 de junho de 2015|Entrevistas|0 Comentários

 

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Da esquerda para a direita: Silvio Guindane, Caio Blat, Mini Kerti (diretora), Alice Braga, Vladimir Brichta, Flávio Tambellini (produtor). (foto: Sonia Rocha)

No último dia 9 o produtor Flávio Tambellini, a diretora Mini Kerti e os atores Silvio Guindane, Caio Blat, Alice Braga e Vladimir Brichta receberam a imprensa especializada (jornalistas, blogueiros e críticos cinematográficos) para uma conversa sobre a produção do filme “Muitos homens num Só” , hoje em cartaz no circuito. Os assuntos foram diversos, num clima de descontração e bom humor, desde os desafios vencidos para a realização do longa, da produção à distribuição, até uma análise sutil do  momento pelo qual passa o cinema nacional e sobre a regulamentação da Ancine acerca do número de salas que podem exibir um mesmo filme (blockbuster estrangeiro). “Muitos Homens num Só” conta a história de um ladrão de hotéis que viveu na cidade do Rio de Janeiro no início do século XX (1915/1917), baseada numa história real e ancorada nos escritos do jornalista João do Rio.

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Foto: Sonia Rocha

Sobre o filme, a diretora Mini Kerti e o produtor Flávio Tambellini falaram sobre as táticas utilizadas para filmar em prédios do século XIX, em Petrópolis e na Biblioteca da Assembléia Legislativa do Rio de janeiro, as angulações e os cuidados, as dificuldades de fazer um filme de época em pleno verão carioca e sobre a edição e montagem do filme para contar essa história. Vladimir acrescentou que para ele o maior desafio foi fazer um filme de época que não fosse refém daquela época. E como não há tantos registros do cotidiano do homem comum do início do século XX, ele teve liberdade para criar e tornar o personagem crível, mas confessou seu temor na hora de compor o personagem do Arthur/Dr. Antônio. Segundo Silvio Guindane a escalação de um bom elenco, de pessoas que se conheciam de alguma maneira,  o roteiro bem costurado e uma direção que sabia o que queria, fez com que a energia e as relações em geral se harmonizassem muito bem. O produtor disse ainda que, o desafio foi a falta de costume que temos de fazer filme de época. “A gente faz filme de trinta atrás. Filme de época não é comum. Acho que é um resgate da História, o filme de certa maneira é uma homenagem ao Rio de Janeiro, ele fala de um Rio de transformações. A época do filme e a do Pereira Passos, o rio também estava sofrendo transformações urbanas, é bonito resgatar a cidade que você vive, a gente, às vezes, não percebe os lugares, os cantos da cidade (…) acho que o cinema tem a obrigação de resgatar o lugar onde você vive, isso ajuda a preservar a memória dos lugares. Quando você faz um filme ele fica pra vida inteira. E esse é um desafio incrível. Você vê no filme o Rio que existe. O cinema mundial faz muito isso. A gente quer resgatar a cidade e ter orgulho do lugar em que a gente vive e da História do lugar, e esse foi o desafio da produção”. Alice Braga destacou ainda, a importância da direção de arte assinada por Kiti Duarte e do figurino de Marina Franco.

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Foto: Sonia Rocha

Sobre ter uma mulher na direção, Silvio Guindane e Caio Blat foram unânimes em dizer que ser dirigido por uma mulher é melhor porque existe toda uma doçura no trabalho e  na forma de olhar. “o olhar de uma mulher é subliminar, é para o subtexto e, não necessariamente, para a  cena em si”. acrescentam ainda que por serem generosas obrigam os demais a serem sensíveis e a se encaixarem na forma com a qual a história merece/precisa ser contada de forma delicada. E que o grande mote de trabalhar com mulheres cineastas é que, normalmente, são menos impositivas e mais subjetivas. Flávio Tambellini vaticina: “o que impressiona na mulher é a sua capacidade de trabalho, a intensidade e a entrega ao que é proposto”.

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(foto: Sonia Rocha)

Mas o ponto alto da entrevista foram as questões relativas ao cinema nacional. Quando perguntados sobre o que achavam que mudou no cinema brasileiro, Alice Braga disse que, possivelmente a conexão do público com o cinema. Vladimir  disse ter a impressão de que o cinema nacional compete bem com os Blockbusters estrangeiros com as comédias, e que isso já é um grande trunfo para uma quase indústria,  que precisa gerar lucro e mobilizar um grande público…“mas que vivemos um momento do filme voltado para grande bilheteria, é como se não existisse o filme médio ou pequeno. Esse [Muitos Homens num Só] é um filme pequeno. Ou você produz pra fazer um milhão em bilheteria ou vai fazer o caminho dos festivais. Filmar hoje em dia é muito mais fácil. O acesso a tecnologia todo mundo tem, mas conseguir distribuir  etc… é a grande dificuldade. Então a gente vive esse momento de produção de comédias, há 10 anos atrás existia o “favela movie” que mobilizava muita gente e começou a se produzir muito, hoje vivemos o momento da comédia que é produzida em maior quantidade e que mobiliza. Vivemos a ausência do filme médio e, praticamente, um gênero dialogando com o público”.  Nesse mesmo viés Tambellini reitera: “porém existem as quebras de gênero. Eu me lembro quando “Cidade de Deus” foi lançado em que escutei várias pessoas dizendo que ninguém assistiria o filme porque bastava olhar os jornais para  se ver violência…e o filme quebrou o gênero predominante na época. As comédias são importantes, são maravilhosas mas daqui a pouco vai surgir um filme que não é comédia e que vai arrebentar. É assim que o cinema se faz. Eu acredito também que existe o filme 100m e o filme maratona. Tem uns filmes que acontecem e evaporam e outros ficam. Hoje, também existem outros meios audiovisuais. As salas de cinema são menos de 50% de um público, há 30 anos atrás era 100%. O cinema está se espalhando, temos a internet, o DVD, a TV a cabo etc… Os filmes que ficam independe, hoje, de um sucesso inicial. Então eu acho que a gente tem que fazer filme em que a gente acredite e apostar que a gente vai ter orgulho de ver este filme daqui a vinte anos. Ainda nesse assunto Flávio Tambellini disse do quanto unir o sucesso de público com um  filme bom é maravilhoso. Mas que há uma crise no cinema independente. Que as distribuidoras independentes fecharam no mundo inteiro e fez um comparativo quantitativo entre o número de salas de cinema no Brasil, México e EUA. O Brasil com aproximadamente 2.300 salas, a maioria multiplex, o México com 4.600 e os EUA com 30.000 salas , nesse contexto Tambellini vaticina, que aqui não disputamos salas, disputamos horário. E que é uma questão econômica, o exibidor quer lucro pois ele precisa pagar o imóvel e suas despesas. Então, é complexo, porque o cinema é arte mas também é um produto. Ele pode ser de vanguarda, ele pode ser de quebra de linguagem, mas não deixa de ser um produto que precisa der exibido”.

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(foto: Sonia Rocha)

Nessa ‘vibe’ a pergunta que não quis calar surgiu. Sobre a regulamentação da Ancine acerca do número máximo de salas que podem ser ocupadas para a exibição de blockbusters estrangeiros. Tambellini responde: ” Sempre houve regras de obrigatoriedade de exibição de filme brasileiro. Agora, com  o número de salas que agente tem, um filme ocupar de 50% a 80% das salas é complicado, mas também tem outro fator, o filme dá 10.000.000 de espectadores. Então como é que faz? Como vai balancear isso? Eu sou contra uma obrigatoriedade rígida porque você também tem que deixar as coisas pulsarem. É complexo isso. Em princípio sou a favor, mas não sei se funciona.” Caio Blat acrescenta que o cinema tem se diversificado bastante num contexto em que a produção se democratizou e as salas diminuíram, tem-se ainda um bilhete muito caro e o que existe de fato é uma ausência de um projeto de educação direcionado para/com  o cinema. E acrescenta: “O próprio filme hoje tem um caminho diferenciado, “Latitudes” começou na internet, virou programa de televisão e depois foi para o cinema. Mini-séries de TV hoje se transformam em filmes, filmes se transformam em mini-séries de TV. A forma com a qual as pessoas consomem o audiovisual, hoje, também mudou”.

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(foto: Sonia Rocha)

Em relação aos projetos futuros de cada um, Caio Blat vai lançar um filme da Marina Person “Califórnia”, acabou de filmar “Barata Ribeiro” de Domingos de Oliveira. Silvio Guindane vai fazer uma série com Breno Silveira e uma peça de Walter Lima Jr. Alice Braga acabou de filmar  uma obra de José Eduardo Belmonte, ainda sem título e um filme nos EUA de Kieran Darcy-Smith chamado “By Way of Helena” e vai fazer uma série americana chamada “Rainha do Sul”. Mini Kerti continua dirigindo “Super Bonita” no GNT e está fazendo um livro de artes para crianças com Isabel Diegues e Priscila Lopes pela Editora Cobogó. Flávio Tambellini vai lançar o filme “Campo Grande” de Sandra Kogut, dirigir o longa “Gloria e Graça” e ainda produz outro filme “10 segundos” que é a história de Éder Jofre dirigido por Rogério Gomes. Vladimir Brichta continua com “Tapas & Beijos”, lança em breve o filme “Real Beleza” de Jorge Furtado e “Um Homem Só” de Claudia Jouvin, além da dublagem do personagem Herb da animação “Minions”.

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(foto: Sonia Rocha)

Sobre o Autor:

Crítica cinematográfica, editora do site Cinema & Movimento, mestre em educação, professora de História e Filosofia e pesquisadora de cinema. Acredito no potencial do cinema para fomentar pensamento, informar, instigar curiosidades e ser um nicho rico para pesquisas, por serem registros de seus tempos em relação a indícios de mentalidades, nível tecnológico e momento histórico.

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