Cantinflas

Por | 2014-10-24T01:14:30-03:00 24 de outubro de 2014|Resenha cinematográfica|0 Comentários

Cantinflas (Cantinflas). (Biografia/Drama); Elenco: Oscar Jaenada, Michael Imperioli, Ilse Salas; Diretor: Sebastian del Amo. México, 2014. 102 Min.

Um dos destaques da mostra foco México no Festival Internacional de Filmes do Rio 2014 foi o filme biografia “Cantinflas” de Sebastian del Amo. Aventurar-se fazer uma biografia não é pouca coisa, ainda mais de alguém com  a importância de Fortino Mario Alfonso Moreno Reyes, conhecido como Mario Moreno. E como se não bastasse imagetizada, transposta para o cinema, o grande veículo do biografado. No mundo das imagens, não só  a leitura é mais aberta e fabulativa, como o alcance é muito maior. Porém Edui Tijerina e Sebastian del Amo aceitaram o desafio e roteirizaram a jornada de Mario Moreno/cantinflas pontuando os momentos mais importantes e decisivos, segundo eles, da vida do ator/comediante. empresário, ativista, e até, político mexicano( sindicalista), por curto tempo. Centrada na ascenção artística e a sua chegada a Hollywood, o recorte de tempo é de 1935 a 1956 e apresenta um desfile de mentalidades, costumes de época e figurino de agradar aos mais desatentos.

cantinflas-2014“Cantinflas simboliza el pesadelo que triunfa sobre los poderosos usando trucos”

(Historiador mexicano – desconhecido (!!!))

Falar sobre uma personalidade da importância de Mario Moreno, seja na ficção, numa cinebiografia, como é o caso, ou num documentário, sempre vai deixar a desejar, pelo fato de ser uma narrativa através do olhar de outro alguém que se vê obrigado a pinçar o que considera mais importante a ser registrado. E nesse contexto, em  “Cantinflas” os aspectos da vida de Mario Moreno foram bem distribuídos, embora o elo entre eles pareçam dar saltos gigantescos. Ali estão registrados sua personalidade forte, sua luta política, sua carreira artística e sua vida pessoal.

cantinfla_f02cor_2014111814“Cantinflas es el iletrado que toma control del lenguaje como puede”

( Carlos Monsiváis)

As  personalidades famosas que perpassaram a vida de Mario Moreno, como Marlon Brando, Yule Brenner, Charlie Chaplin, Elisabeth Taylor, Frank Sinatra não poderiam ser esquecidos e lembram a distancia social percorrida ao longo de sua carreira, da origem a glória, que é pontuada pelos principais empregos que teve ao longo da carreira. A sua  ascenção foi costurada pela sua originalidade, personalidade forte, inteligência e coragem. Defeitos? Os teve, é claro. Mas, numa homenagem basta dizer que é ser humano que os defeitos já estão incluídos no pacote. O que importa é ressaltar onde esse ser humano foi maior que seus defeitos. A jornada de luta política de Mario Moreno também está presente em “Cantinflas” em cenas de engajamento.

thumbnail_19122En condensarlos, en entregar a saldable carcajada del pueblo la esencia demagogica de su vacuo confusionismo, estriba el mérito y se asegura la gloria de este hijo cazurro de la ciudad ladina y burlona del Mexico, que es Cantinflas”

(Salvador Nuovo)

O filme é lampejo de luz sobre a trajetória de um cidadão do mundo comparável a Charles Chaplin, Groucho Marx e Mazaroppi. Mas, mais do que isso deixa o público com vontade de saber mais sobre essa personalidade  tão importante para o México, que chegou a fazer parte do vocábulo oficial da língua espanhola no México (ver curiosidade no final) e na cultura mexicana. Ganhou um Globo de Ouro em 1956 de melhor ator de comédia pelo filme “A volta ao mundo em 80 dias” atuando com David Niven, e deixando Marlon Brando para trás na corrida pelo prêmio. Isso não é pouca coisa para um latino. Quando de seu falecimento em 1993 mereceu um velório de três dias e um minuto de silêncio de toda a nação norte americana.

c02442“Su lengaje enredoso expresaba elocuentemente las contradiciones de la modernidad como ‘el momento palpitante de todo lo que quere ser y no puede’. De igual forma ‘las jerarquias sociales, los patrones del lenguaje, las identidades etnicas y las formas masculinas de comportamentos, todos cayeron ante su humor caótico para ser reformulados em nuevas formas revolucionarias”

(Jeffrey M. Pincher)

Edui Tujerina e Sebastian del Amo foram, antes de tudo, corajosos quando embarcaram na aventura. E ela já rendeu o prêmio de melhor figurino do Festival de Filmes de Guadalajara e foi destaque no Festival de Filmes do Rio de Janeiro. Sebastian del Amo em seu primeiro filme “O fantástico mundo de Juan Orol” (2012) recebeu três premiações em festivais. Para realizar “Canfinflas” contou com ator espanhol Óscar Jaenada (Mario Moreno/Cantinflas) de “Piratas do Caribe – em aguas misteriosas” (2011); Michael Imperioli (Michael Todd) de “The Sopranos” e Ilse Salas (Valentina) de “Güeros”. A trilha sonora conta com músicas das décadas de 30 a 50 num pot-pourri de dar gosto. Os Takes evoluem também de acordo com a época que retrata. Numa metalinguagem muito bonita.

540x372xScreenshot_2014-06-14-15-17-04-e1402784707725-540x372.png.pagespeed.ic.om66jhwgpu“Entender Cantinflas es entender lo que ha pasado en mexico en todo el siglo pasado”(Gregório Luke – Museu de Arte latinoamericano)

Para mais do que uma cinebiografia, o filme “Cantinflas” é um instrumento de manutenção de memória, de oficialização de um exemplo de sucesso e de possibilidade de mudança de mundo para gerações posteriores, um registro da mentalidade de uma época e de um contexto cultural.  É o  cinema a serviço da história do cinema.

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Curiosidade: A importância de Mario Moreno/Cantinflas  foi tanta  para o méxico, que a Real Academia Espanhola acrescentou o verbo Cantinflear  e as palavras Cantinflas y Cantinflada ao vocabulário oficial e ao dicionário da língua espanhola do México. E mais adiante foram acrescidos três adjetivos: Cantinflesco; Cantinflero e Acantinflado e ainda um substantivo: Cantinfleo. Isto significa, grosso modo, que “Cantinflas” se imiscuiu à cultura mexicana  de tal forma que passou a ser parte de sua identidade nacional oficialmente.

Sobre o Autor:

Crítica cinematográfica, editora do site Cinema & Movimento, mestre em educação, professora de História e Filosofia e pesquisadora de cinema. Acredito no potencial do cinema para fomentar pensamento, informar, instigar curiosidades e ser um nicho rico para pesquisas, por serem registros de seus tempos em relação a indícios de mentalidades, nível tecnológico e momento histórico.

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